O cenário político brasileiro nunca foi tão incerto. O atual presidente da República, Michel Temer (PMDB), se tornou o primeiro na história a ser denunciado criminalmente ocupando o mais alto cargo da república e se esforça para conseguir permanecer no cargo até o fim de 2018.
Enquanto isso, o líder nas pesquisas eleitorais para o pleito de 2018, o ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva foi condenado criminalmente a nove anos e meio de prisão pelos crimes de lavagem de dinheiro e corrupção passiva no processo do tríplex do Guarujá. É o primeiro ex-presidente condenado por crime comum. Conseguirá um condenado ser candidato? Se eleito, poderá assumir?
Na sentença que condenou o ex-presidente, o juiz Sérgio Moro escreveu o seguinte: “Em decorrência da condenação pelo crime de lavagem, decreto, com base no art.7º, II, da Lei nº 9.613/1998, a interdição de José Adelmário Pinheiro Filho e Luiz Inácio Lula da Silva, para o exercício de cargo ou função pública ou de diretor, membro de conselho ou de gerência das pessoas jurídicas referidas no art. 9º da mesma lei pelo dobro do tempo da pena privativa de liberdade”.
Há controvérsia, contudo, sobre o momento em que essa determinação pode ser aplicada. Alguns especialistas ouvidos pela reportagem entendem que a restrição só se aplicaria depois do trânsito em julgado da condenação. Outros, que a restrição poderia ser aplicada a partir de eventual confirmação da condenação no Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
O STF tratou apenas da possibilidade de executar a prisão em segundo grau e não chegou a avaliar a execução dos efeitos secundários das condenações. Em tese, após a publicação do acórdão Lula fica, sim, impedido de exercer cargo ou função pública. Neste cenário, a defesa de Lula teria uma dupla dificuldade para viabilizar a candidatura: suspender os efeitos da lei da ficha-limpa no âmbito eleitoral, se mantida a condenação pelo TRF4, além de suspender os efeitos secundários da condenação em segundo grau até o trânsito em julgado do processo.
Ficha-suja?
A reportagem do JOTA traçou possíveis cenários a partir de conversas com juízes, promotores, advogados eleitorais, constitucionalistas e criminalistas.
Cenário 1: TRF4 confirma condenação de Lula antes da eleição
Neste caso, Lula estaria impedido de concorrer porque seria considerado um candidato ficha-suja. Além disso, poderia ser preso com base no entendimento do Supremo Tribunal Federal de que a execução da pena se dá a partir da condenação em segunda instância.
Cenário 2: Lula é eleito e TRF4 o condena depois da eleição, mas antes da diplomação (meados de dezembro)
É o cenário mais caótico. Na visão de alguns advogados eleitorais, Lula poderia ser considerado um ficha-suja e ser impedido de assumir o mandato desde que o processo de registro de candidatura ainda estivesse aberto.
O processo de registro de candidatura poderia estar aberto mesmo depois da eleição, desde que houvesse algum recurso questionando o registro ainda pendente de decisão.
Por outro lado, neste cenário o TRF4 poderia requisitar a execução imediata da pena, que prevê a perda dos direitos políticos. Neste caso, Lula só conseguiria assumir a Presidência se conseguisse uma decisão num recurso com efeito suspensivo que lhe permitisse recorrer em liberdade até o trânsito em julgado do processo criminal.
Cenário 3: Lula é eleito e TRF4 não julga o caso até a diplomação
Lula é diplomado e, assim, se torna presidente. Uma vez na Presidência da República, o foro de Lula se torna o Supremo Tribunal Federal e os processos que estão em curso são remetidos ao tribunal. Apesar de o artigo 86, § 4º, dizer que “o Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções”, como o processo já está em curso deverá haver um debate no STF se a ação deverá prosseguir ou não.
Caso decidam que sim, o presidente estaria suspenso de suas funções por 180 dias. Se não for julgado até o fim deste período, Lula retornaria ao cargo. Se condenado, mesmo depois de transcorrido este período, será preso.
Caminhos da apelação de Lula no TRF4
O TRF4 leva em média um ano para analisar recursos da defesa, decidindo confirmar ou reformar a sentença. Até agora, o tribunal aumentou a pena para a maior parte dos casos da Lava Jato avaliados.
Assim como a força tarefa da Lava Jato anunciou que vai recorrer para aumentar a pena de Lula, a defesa do ex-presidente também deve apresentar nos próximos dias apelação contra a sentença.
Após sentença de Moro, os advogados de Lula têm prazo de cinco dias para apresentação de apelação. Feita esta etapa, o MP se manifesta e, na sequência, o processo segue para o TRF4, em Porto Alegre.
No TRF4, os casos são analisados na 8ª Turma do TRF4, especializada em matéria criminal, integrada por três desembargadores. O processo deve ser encarregado ao desembargador João Pedro Gebran Neto, que é o relator da Lava-Jato na segunda instância.
O desembargador abre espaço para apresentação de parecer da Procuradoria Regional da República da 4ª Região. A defesa também pode apresentar “razoes de apelação”. Com as manifestações de acusação e defesa, o desembargador-relator Gebran elabora um relatório e o voto.
O caso segue para chamado o desembargador-revisor Leandro Paulsen, que vai analisar o voto do relator e fechar sua posição. Depois disso, os votos dos dois seguem para o desembargador Victor Luiz dos Santos Laus e o julgamento de apelação pode ser marcado.
Após a decisão da 8ª Turma do TRF4, cabem recursos ainda ao próprio tribunal. A depender do placar do resultado, podem ser apresentados embargos declaratórios, pedindo esclarecimentos da sentença, ou embargos infringentes, que poderia alterar a decisão e prolongar uma definição do caso pelo tribunal.
Após decisão final do TRF4, cabe recurso especial ao STJ e recurso extraordinário no STF.
