O Ministério Público Federal (MPF) defendeu, em manifestação enviada ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), o direito de as mulheres transexuais poderem se utilizar de medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006). O tema é analisado no âmbito do recurso especial do Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP) contra decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) que negou proteção pleiteada por mulher transexual agredida por seu pai.
Na decisão, o tribunal paulista julgou que a Lei Maria da Penha é aplicável somente em casos de violência doméstica ou familiar contra pessoas do sexo feminino — considerando exclusivamente o aspecto biológico.
O MPF opôs-se à impossibilidade de conceder proteção em favor da vítima por ela ser transexual e lembrou que o artigo 5º da lei caracteriza a violência doméstica e familiar contra a mulher como qualquer ação ou omissão baseada no gênero. Leia a íntegra da manifestação no Resp 1.977.124.
Segundo a subprocuradora-geral da República Monica Nicida Garcia, “ao restringir a aplicação das medidas protetivas da Lei Maria da Penha à acepção biológica (sexual) de mulher, excluindo como sujeito passivo o transexual feminino, a decisão contrariou o artigo 5° da Lei 11.340/2006 e ofendeu os princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana, além da Constituição Federal, que prevê̂ que o Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”.
O MPF argumentou em favor do direito à proteção da mulher transexual, independentemente de cirurgia de transgenitalização, e sustentou que o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que o direito à igualdade sem discriminações abrange a identidade ou expressão de gênero.
A subprocuradora-geral da República ainda afirmou que, se Lei Maria da Penha, tem por finalidade corrigir distorções históricas, culturais e sociais que vitimizam a mulher em razão do gênero, a rigor se justifica a invocação do instrumento para a proteção da mulher trans, dado que se encontram em situação de dupla vulnerabilidade. As violações de direitos humanos decorrentes de orientação sexual ou identidade de gênero são com frequência agravadas por outras formas de violência, ódio, discriminação e exclusão.