Racismo

Homem que anunciou venda de escravo na internet terá de prestar serviços comunitários

Condenado e a vítima se conheciam por meio de um grupo de jovens da igreja

sociedade estruturalmente racista, burocracias
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O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) abrandou a pena de um homem condenado por publicar nas redes sociais um anúncio no qual ofertava uma pessoa negra como escrava e determinou que ele preste 365 horas de serviços comunitários. A decisão foi proferida por unanimidade pela 7ª Turma na última semana (14/2).

Segundo a denúncia, em 2013, o acusado divulgou nas redes sociais Ask.fm e Facebook um link com um anúncio que direcionava o usuário para uma página do Mercado Livre em que um homem negro era oferecido à venda como escravo.

“Negro Africano Legítimo. Único Dono. Bom Estado de Saúde. Serviços. Animais. Transporte. Alguém precisa de ummm… UM ESCRAVO. Baratinhoo. Único Dono.”

Usuários apontaram o teor racista da postagem. Em resposta, o homem escreveu: “baratinhoo… to com uma família inteiraa aqui aushaushaus como este é o mais novo e tall… uns $2,000”. O condenado e a vítima se conheciam por meio de um grupo de jovens da igreja.

O homem foi denunciado pelo Ministério Público Federal (MPF) pelos crimes de racismo e de injúria racial, sob o argumento de que o homem valeu-se de elementos de raça para ofender, não apenas a dignidade da vítima, mas da coletividade.

A defesa sustentou que o acusado não tinha a intenção de ofender a vítima nem a raça negra e que ele a procurou para pedir desculpas, dizendo que se tratava apenas de uma brincadeira.

Diante disso, o juiz da 1ª Vara Federal de Ponta Grossa, André Wasilewski Duszczak, que apreciou o caso na primeira instância, entendeu que ficou comprovada a ocorrência do crime de injúria racial. No entanto, pelos depoimentos e documentos, não era possível afirmar que ele agiu com a intenção de menosprezar a raça.

O magistrado condenou o homem a um ano de reclusão, tendo a pena sido substituída pela prestação de serviços à comunidade, à razão de uma hora por dia de condenação, e pelo pagamento de três salários mínimos.

De acordo com o Código Penal, uma pena privativa de liberdade pode ser substituída quando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente.

O relator, juiz convocado no TRF4 Danilo Pereira Júnior, ao julgar o caso considerou que “o dolo requerido pelo tipo penal foi verificado presente no caso. Ainda que o réu afirme não haver pretendido menosprezar a vítima, a cabal admissão no interrogatório de que enviara o anúncio do Mercado Livre em formato privado para a vítima demonstra o dolo do tipo penal. A alegação de que estava praticando espécie de humor ou brincadeira, não serve para afastar o delito”.

“Efetivamente, no caso dos autos, não se verifica a intenção de induzir ou incitar preconceito de raça, cor ou etnia, a grupo indistinto. Correta a sentença no ponto em que absolveu o réu da imputação capitulada no § 2º do art. 20 da Lei nº 7.716/89, razão pela qual se impõe o desprovimento da apelação do Ministério Público Federal”, escreveu o relator.

Mas, o fato de que o acusado “teria acrescido comentário à postagem cuja autoria nega, tecendo consideração sobre familiares do menino negro oferecido à venda, e justificativa do seu preço, consubstanciam a conduta típica e evidenciam o elemento subjetivo especial requerido pelo tipo, o especial fim de discriminar a vítima, com o objetivo de atingir a sua honra e a sua dignidade como pessoa humana, ofendendo-lhe, por razão de raça, cor, etnia, religião ou origem, a honra e a dignidade do ser humano”.

Ainda assim os desembargadores deram parcial provimento à apelação do condenado, para retirar da condenação a prestação pecuniária imposta como segunda restritiva de direitos substitutiva da privativa de liberdade, já que a condenação não foi superior a um ano.

O processo tramita com o número 5011775-33.2019.4.04.7009.