A Advocacia-Geral da União (AGU) apresentou defesa não só para o presidente Jair Bolsonaro (PL) em uma ação de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público Federal (MPF) contra ele, mas também passou a representar a ex-assessora parlamentar Walderice Santos da Conceição, a Wal do Açaí, que é acusada de ser uma funcionária fantasma no gabinete que Bolsonaro ocupava na Câmara dos Deputados. O fato foi revelado pelo jornal “O Globo” e confirmado pelo JOTA.
Walderice foi indicada pelo então deputado federal Jair Bolsonaro, em fevereiro de 2003, para ocupar o cargo de secretária parlamentar em seu gabinete em Brasília. Ela foi funcionária do gabinete até 2018, quando foi exonerada, depois de uma reportagem da “Folha da S.Paulo” mostrar que ela seria uma funcionária-fantasma.
A investigação revelou que, entre 2003 e 2008, Walderice nunca esteve em Brasília, não exerceu qualquer função relacionada ao cargo e ainda prestava, juntamente com seu companheiro, Edenilson Nogueira Garcia, serviços particulares para Bolsonaro, como cuidados com a casa e com os cachorros do agora presidente da República, na Vila Histórica de Mambucaba. Além disso, Walderice cuidava de uma loja de açaí na região.
A ação de improbidade contra Bolsonaro e Wal do Açaí requer que os dois sejam condenados pela prática de improbidade administrativa, além do ressarcimento dos recursos públicos supostamente desviados.
Bolsonaro é processado porque, segundo o MPF, ele tinha conhecimento de que Walderice não prestava os serviços correspondentes à função e, mesmo assim, atestou falsamente a frequência dela em seu gabinete para comprovar a jornada de trabalho exigida pela Câmara dos Deputados para possibilitar o pagamento dos salários.
Ainda segundo o MPF, a análise das contas bancárias de Wal do Açaí revelou uma movimentação atípica, já que 83,77% da remuneração recebida nesse período foi sacada em espécie.
A defesa de Wal do Açaí e de Bolsonaro é assinada pelos advogados da União Vinicius Torquetti Domingos Rocha, Diogo Palau dos Santos, Flávio Tenório Cavalcanti de Medeiros e Alexandre Dantas Coutinho Santos.
Na peça, eles requerem a rejeição da ação “por inexistência de ato de
improbidade administrativa”. Sobre o fato de Wal do Açaí nunca ter pisado em Brasília, a AGU afirma que “inexiste irregularidade (ou crime, conforme sugere o MPF) em atestar a frequência de servidores cujo exercício não seja em Brasília”.
Além disso, sustentam que “da instrução do processo e do teor da inicial verifica-se que o autor, Ministério Público Federal, limitou-se a instruir o feito com reportagens e ilações a respeito dos supostos desvios atribuídos aos réus”. De forma que a ação, para a AGU, deve ser rejeitada.
O fato de a AGU apresentar a defesa de Wal do Açaí causou estranheza. “Fui procurador do Estado por muitos anos. A defesa de alguém que não é funcionário público me parece uma utilização indevida dos recursos públicos e da administração pública. Há um desvio, muito claro”, avalia Oscar Vilhena, professor de Direito Constitucional da FGV Direito SP. “Além disso ela tem um interesse em comum com o presidente da República, o que viola o princípio da impessoalidade do Direito Administrativo.”
O processo tramita na Justiça Federal do Distrito Federal com o número 1015093-34.2022.4.01.3400.