
O ex-juiz Sergio Moro assinou nesta quarta-feira (10/11) sua filiação ao Podemos e, em discurso, fez críticas ao governo de Jair Bolsonaro, do qual participou como ministro da Justiça, e ao PT. Ele já sinalizou a aliados que deve disputar a Presidência da República nas eleições de 2022 e, no final de sua fala, se colocou à disposição do partido para liderar o projeto nacional.
“Meu desejo era de continuar atuando como ministro em favor dos brasileiros. Infelizmente, não pude prosseguir no governo. Quando aceitei o cargo, não fiz por poder ou prestígio. Acreditava em uma missão: queria combater a corrupção. Para isso, precisava do apoio do governo, e esse apoio foi negado. Quando vi meu trabalho boicotado, quando foi quebrada a promessa de que o governo combateria a corrupção sem proteger quem quer que seja, continuar seria apenas uma farsa”, disse em uma das vezes em que criticou Bolsonaro.
Em sua fala, no palco do Centro de Convenções Ulysses Guimarães, em Brasília, Moro criticou o nível de desemprego no país, afirmando que o problema vem desde os governos do PT. O ex-juiz também relembrou o escândalo do mensalão, ocorrido durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, e citou a “rachadinha”. Filho mais velho do presidente, Flávio Bolsonaro é suspeito de recolher parte dos salários dos servidores de seu gabinete na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) e de ter empregado funcionários fantasmas.
“Chega de mensalão, chega de petrolão, chega de rachadinha, chega de orçamento secreto. Chega de querer levar vantagem em tudo e de enganar o povo brasileiro”, afirmou em outro trecho do discurso, realizado na frente de um telão que reproduzia uma enorme bandeira do Brasil.
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Orçamento secreto é como ficaram conhecidas as emendas de relator, criadas no governo Bolsonaro, cuja destinação das verbas é feita de forma sigilosa, a partir de acordos políticos. A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votou pela manutenção da liminar da ministra Rosa Weber que suspendeu a execução orçamentária dessas emendas e determinou a publicação em 30 dias de forma detalhada das despesas realizadas por meio dessa rubrica nos anos de 2020 e 2021.
Em outro momento, quando defendeu o fim do foro privilegiado e o fim da reeleição para cargos no Poder Executivo, Moro voltou a criticar Bolsonaro: “O presidente, assim que eleito, e eu vi isso, começa, desde o primeiro dia, a se preocupar mais com a reeleição do que com a população. Está em permanente campanha política”.
As críticas a Bolsonaro continuaram quando Moro disse que “as Forças Armadas pertencem aos brasileiros e não ao governo” e quando defendeu o trabalho da imprensa: “Chega de ofender ou intimidar jornalistas. Jamais iremos estimular agressões, jamais iremos propor o controle sobre a imprensa”, discursou. O ex-juiz também lembrou a pandemia de Covid-19 e exaltou a ciência, em mais uma crítica velada ao presidente.
O ex-ministro defendeu a lista tríplice do Ministério Público e a autonomia da Polícia Federal “para impedir interferência política no trabalho deles”. Como presidente, Bolsonaro ignorou a lista tríplice do MPF e escolheu Augusto Aras para a Procuradoria-Geral da República (PGR) por duas vezes. Moro deixou o Ministério da Justiça afirmando que o presidente tentou intervir na PF.
O ex-juiz contou por que resolveu aceitar o convite de Bolsonaro para comandar o Ministério da Justiça e, foi nesse momento, que, mais uma vez, direcionou críticas às gestões petistas: “Como todo brasileiro, tinha, em 2018, esperança em dias melhores. Como todo brasileiro, pensava no que havíamos presenciado nos últimos anos: os grandes casos de corrupção sendo revelados dia a após dia, pixulecos, as contas na Suíça, milhões de reais e dólares roubados. A Petrobras, nosso orgulho, foi saqueada dia e noite por interesses políticos como nunca antes nesse país”, listou ele, completando que havia ainda “recessão provocada pelos mesmos governos”.
O ex-ministro dedicou boa parte de seu discurso às falas sobre sua atuação na Operação Lava-Jato e ao combate contra a corrupção. “É mentira dizer que acabou corrupção quando, na verdade enfraqueceram as ferramentas para combatê-la”, afirmou.
Ao assinar a filiação ao Podemos, Moro contraria declarações anteriores de que não entraria para a política. Logo no início de sua fala, o ex-magistrado salientou algumas vezes o fato de não ter carreira política e não ser “treinado em discursos políticos”.
Teto de gastos
Ao longo de seu discurso, Moro fez acenos ao mercado. Disse que o Brasil precisa de reformas e citou especificamente a tributária. “Essas reformas nunca chegam e, quando chegam, são mal feitas, e o Brasil continua sendo esse país do futuro”, declarou.
Outro ponto de crítica foi a possibilidade de furo do teto de gastos: “Ao olharmos para as reformas que estão sendo aprovadas, o que a gente percebe é que ninguém está pensando nas pessoas. Mesmo quando se quer uma coisa boa, como se quer esse aumento do Auxílio Brasil ou Bolsa Família, que são importantes para combater a pobreza, vem alguma coisa junto ruim, como o calote de dívidas, furo no teto de gastos e o aumento de recursos para outras coisas que não são prioridades”, discursou.
Ele também criticou a inflação em alta. “Os juros subiram, dificultando ainda mais a vida do empresário, agricultor ou das pessoas comuns. Os juros ainda vão subir mais nesse governo, e isso vai tornar a vida das pessoas mais difícil. Não digo isso porque sou pessimista, mas porque o país se encontra no rumo errado”, afirmou o ex-juiz.
Ao falar do contexto econômico e citar o desemprego, Moro criticou novamente o PT: “Desde a época do PT, o desemprego começou a crescer e não parou mais”, disse.
Privatizações
Moro defendeu o livre mercado e afirmou ser preciso “privatizar estatais deficientes”. “Quando o governo finalmente resolve vender uma empresa estatal como a Eletrobras, aprova junto uma série de jabutis, coisas que ninguém entende direito e que, na prática, todo mundo sabe que significa que a conta de luz vai ficar mais cara para alguém ganhar mais dinheiro”, afirmou.
Entre as promessas, o ex-ministro falou sobre a criação de uma força-tarefa permanente de erradicação da pobreza e a volta da execução da condenação criminal em segunda instância.
No início do discurso, o ex-ministro brincou com o fato de sua voz ser alvo de piadas. “O Brasil não precisa de líderes que tenham voz bonita, mas que ouçam a voz do povo brasileiro”, declarou.