Procurador sorteado para atuar no processo que investiga a administradora Alvarez & Marsal e envolve o ex-juiz Sergio Moro no Tribunal de Contas da União (TCU), Júlio Marcelo de Oliveira, em entrevista ao JOTA, rebateu o subprocurador-geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (MPTCU) Lucas Rocha Furtado, que havia pedido a sua suspeição para atuar no caso, e criticou o ministro do TCU Bruno Dantas, relator do processo.
Como o JOTA mostrou, Furtado anexou ofício no processo na última terça-feira (25/1) em que suscitou a suspeição de Júlio Marcelo. Para isso, alegou que a relação de amizade entre Moro e o colega deveria impedir que o procurador “atuasse no processo em análise, em face da dúvida sobre sua imparcialidade e/ou independência”.
Em entrevista ao JOTA, Júlio Marcelo disse, no entanto, não ter qualquer vínculo de amizade com o ex-juiz da Lava Jato, ao contrário do que seu colega de MPTCU argumenta. “Eu não tenho relação de amizade com o Sergio Moro, nem com ninguém da Alvarez & Marsal. Então, me sinto completamente isento para atuar no processo e só atuo porque fui sorteado. Não tenho interesse nenhum pessoal em atuar no processo para o qual eu não tenha sido sorteado, ao contrário do Lucas”, afirmou Júlio Marcelo, que defende o arquivamento do processo que envolve o ex-ministro da Justiça no TCU.
O procurador do processo que envolve Moro declarou ser “uma completa inversão de valores” que o procurador sorteado de forma impessoal para atuar no processo tenha a suspeição arguida “pelo procurador que não tem competência para atuar” no caso, “mas que atua por voluntarismo”. “Não tem nenhuma razão profissional para [ele] atuar no processo, mas atua com vontade pessoal, o que não é dado aos membros do Ministério Público. Então, falta legitimidade e coerência para essa arguição”, disse o procurador ao JOTA.
O processo foi aberto por iniciativa de Furtado. Júlio Marcelo alega que, por isso, ele não pôde participar do sorteio que definiu quem seria o procurador competente para atuar no caso que envolve Moro no TCU. “É mentira que ele [Furtado] atua nos autos respaldado por regulamento. Não existe nenhum regulamento que dê respaldo à atuação dele. Existe uma norma muito clara que afasta o procurador que ingressou com a representação do sorteio justamente para que ele não atue mais”, afirmou Júlio Marcelo sobre o colega de MPTCU.
O procurador disse que o que Furtado está fazendo “é uma burla a essa norma, mandando ofícios ao relator” do caso, o ministro Bruno Dantas. Júlio Marcelo, que atuou na fiscalização das “pedaladas fiscais” da ex-presidente Dilma Rousseff no TCU, afirmou que o ministro acolhe e coloca os ofícios no processo e os usa como motivo para tomar decisões.
O ministro Bruno Dantas derrubou sigilo sobre o processo que investiga a administradora Alvarez & Marsal e Moro por suspeitas de práticas ilegítimas de revolving door — quando agentes de alto escalão do Estado migram para o setor privado —, e lawfare, que seria a perseguição direcionada a investigados na Operação Lava Jato. Por conta disso, o Centrão já estuda nos bastidores a criação da CPI do Moro.
Em ofício anterior ao de Furtado, Júlio Marcelo já havia solicitado que “sejam desentranhadas as indevidas manifestações e elementos carreados aos autos pelo Exmo. Subprocurador-Geral Lucas Rocha Furtado após a regular atribuição de competência para neles oficiar a este membro do MP de Contas”. Depois do documento protocolado pelo subprocurador, Júlio Marcelo declarou que vai aguardar para saber se o relator publicará algum despacho.
“O relator não acolhe, resiste à atuação do procurador natural e acolhe as intervenções do procurador de exceção. Então, o devido processo legal está comprometido nesse processo”, disse o procurador.
Em seu ofício, Furtado salientou que “a relação amigável e de admiração entre o Sr. Júlio Marcelo e o ex-juiz Sergio Moro é de conhecimento público”. “Dessa forma, a suspeição do Sr. Júlio Marcelo – decorrente da relação de amizade mantida com o ex-juiz Sergio Moro – deveria impedir que este atuasse no processo em análise, em face da dúvida sobre sua imparcialidade e/ou independência. Ressalto que não estou solicitando minha atuação nos autos”, afirmou o subprocurador.
Júlio Marcelo disse ao JOTA que, ao contrário do que aponta o colega, não é amigo de Moro: “Ele [Furtado] conclui isso a partir de postagens antigas minhas em que eu elogiei o Sergio Moro, o juiz, lá atrás e em eventos institucionais. Não tenho relação de amizade [com Moro], nunca fui à casa dele, nunca almocei com ele…”.
Pedido de não conhecimento
Sobre o processo em si, o procurador afirmou que os auditores já se pronunciaram e apontaram que a representação não deveria ser conhecida por falta de competência do TCU para fiscalizar essa matéria. Júlio Marcelo concordou com os técnicos.
“O TCU fiscaliza o gasto público. Não existe gasto público nessa matéria”, disse, completando: “Uma alegação genérica de que a investigação da da Odebrecht teria causado danos aos cofres público, teria, então, que envolver todos os agentes públicos dessa cadeia de tratamento da empresa: policiais, procuradores, os ministros do Supremo porque a colaboração premiada, o acordo de leniência da Odebrecht, foi homologado pelo Supremo, e os agentes da Receita Federal”.
Para o procurador, o curso normal desse processo seria ser levado a julgamento. “Mas o ministro pode entender que não está maduro ainda e vai ficar com essas indagações investigando algo que, ao meu ver, foge da competência do TCU”.