JOTA publica série de artigos sobre o seminário 10 anos da Lei de Drogas

Em 2006, ano em que foi editada a Lei 11.343, conhecida como Lei de Drogas, pouco mais de 12% dos 383.480 detentos encarcerados no país estavam presos por crimes relacionados ao tráfico de drogas. Menos de 10 anos depois, em 2012, este percentual mais do que dobrou, fazendo com que um a cada quatro dos 548.003 presos no Brasil estejam atrás das grades por tráfico.

Para discutir os efeitos da Lei de Drogas, o JOTA junto com o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), a Plataforma Brasileira de Política de Drogas (PBPD) e a Associação dos Advogados de São Paulo (AASP) organizaram o Seminário 10 anos da Lei de Drogas no final de setembro. Ao longo desta semana, iremos publicar uma série de artigos escritos pelos organizadores e colaboradores.

Palestrante no evento, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou que quando foi sancionada a lei tinha um caráter liberatório, mas, ao longo dos anos se identificou o contrário. A grande discussão, segundo o ministro, está em torno da proporcionalidade das prisões pelo porte das drogas, em que, na maioria das vezes, os juízes classificam usuários como traficantes.

“A conclusão foi que a criminalização levava a uma desproporcionalidade, e aí há necessidade de buscar caminhos alternativos”, afirmou o ministro, que votou pela descriminalização do porte de drogas para todas as substâncias desde que para uso pessoal no julgamento acerca da constitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas. O caso está parado há mais de um ano desde o pedido de vista do ministro Teori Zavascki.

Tara punitiva

Na avaliação de Cristiano Maronna, vice-presidente do IBCCRIM, “o Judiciário tem tara punitiva pela prisão a quem é pego com drogas. A prática judicial tem mostrado que prisão cautelar é a regra, quando deveria ser exceção”.

O defensor público Vittore Maximiano, que atua nas audiências de custódia no Fórum da Barra Funda, em São Paulo, tem a experiência de como é lidar com o tema no dia-a-dia. Segundo ele, a falta de dados dificulta um debate com profundidade e consequentemente a criação de políticas públicas. “O Judiciário chega a decidir que prisão é boa para recuperar o usuário, o que considero o fim dos tempos”, criticou.

O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Rogério Schietti também concorda que a diferenciação do usuário e do traficante é um problema para o Judiciário. “A impressão que se tem é que muitos julgadores ainda resistem em fazer essa importante distinção”, afirmou em entrevista. Desde que tomou posse no STJ, dos 30 mil processos que tramitaram em seu gabinete, 7 mil referiram-se a tráfico.

Exemplo vizinho

Um dos palestrantes do seminário foi o ex-integrante da Suprema Corte colombiana Eduardo Cifuentes, responsável por prolatar a sentença que descriminalizou o porte de drogas no país. Por lá, quem carrega drogas para porte pessoal não pode ser preso desde 1994. Além disso, em 2014, a Suprema Corte também autorizou o uso de drogas para fins medicinais.

“Entendemos que só um estado totalitário poderia legislar sobre a liberdade individual e moral da intimidade”, disse o magistrado. “O estado de Direito não tem função de aplicar sanções penais ao uso de drogas. Isso é inconstitucional e viola liberdade individuais”.