Além dos sete integrantes do Tribunal Administrativo do Cade – todos conselheiros com mandatos de quatro anos – o presidente da República nomeia o Procurador Geral e o Superintendente Geral do Cade.
Michel Temer indicou Alexandre Barreto e Maurício Maia para o tribunal administrativo e poderá encaminhar ao Senado mais um nome em janeiro, quando vence o mandato do atual presidente-interino Gilvandro Vasconcelos de Araújo. Em seu mandato de dois anos e meio no Palácio do Planalto, o peemedebista eleito como vice de Dilma Rousseff indicaria, portanto, três dos sete conselheiros.
Antes disso, dois postos-chave estão nas mãos do Palácio do Planalto. O procurador Victor Rufino renunciou ao mandato seis meses antes do término para assumir a sociedade do Mudrovitsch Advogados em São Paulo. E o mandato do atual superintendente-geral, Eduardo Frade, termina no fim de julho.
Sobre os dois postos recaem responsabilidades únicas. A possibilidade de interferência política, em prol de empresas próximas ao grupo político de Michel Temer, gera calafrios justificados nas áreas jurídica e empresarial.
Cabe ao Procurador do Cade não apenas representar o conselho no Judiciário, defendendo em juízo as decisões do tribunal administrativo questionadas por grandes e pequenas empresas e associações, como também fiscalizar na prática o cumprimento de medidas impostas pelo Plenário – como o pagamento de multas, venda de ativos, adoção de programas de compliance, abstenção de disputa de licitações, divulgação de preços e um etecétera cada dia mais amplo.
Somente nos últimos doze meses, passaram pela Procuradoria acordos que solucionaram problemas históricos como um acordo com as maiores processadoras de suco no chamado Cartel da Laranja e com a Nestlé, para resolver a compra da Garoto. No Supremo Tribunal Federal, o procurador atua como representante da autarquia na disputa sobre a quem cabe a palavra final sobre fusões e aquisições de bancos, se ao Cade ou ao Banco Central.
Representante da Advocacia Geral da União no Cade, o procurador ainda emite pareceres sobre atos de concentração e processos administrativos, além de ter a prerrogativa de provocar o Plenário a adotar medidas preventivas – um tipo de intervenção como a desejada pela JBS contra a Petrobras.
O cargo está vago, ocupado interinamente pelo procurador-adjunto Fernando Barbosa Bastos Costa, adjunto de Rufino e tido como um advogado de visão alinhada aos valores técnicos do Cade. Michel Temer pode indicar o novo procurador a qualquer momento.
Advogados relataram ao JOTA que o ministro Moreira Franco vem realizando consultas no mercado sobre o melhor nome para ocupar o cargo. Bancos foram procurados pelo ministro, responsável pela indicação formal de Alexandre Barreto e Maurício Maia, e responsável pelo programa de privatizações do governo Temer, o PPI.
Investigador, negociador e aprovador de fusões
O temor maior do mercado reside na captura do cargo de superintendente-geral. Responsável por autorizar monocraticamente – após análise pela área técnica – a maioria das fusões, aquisições, joint ventures e outros contratos de concentração econômica, o SG detém um poder como nenhum outro servidor do Cade.
Ele é responsável pela abertura de processos de investigação contra empresas por violações à ordem econômica – como a prática de preços predatórios, discriminação, abuso de poder dominante, carteis e outros.
Também é o representante do Cade na Lava Jato e negocia acordos de leniência e Termos de Compromisso de Cessação (TCC) com pessoas jurídicas envolvidas em infrações à Lei de Defesa da Concorrência. É ele, ainda, quem assina a visão da área técnica em casos de fusão complexas ou que exigem adoção de remédios – como a venda de uma marca ou fábrica – para irem em frente.
Quando o Congresso Nacional discutia a atualização da lei antitruste – da Lei 8.884/1994 para a 12.529/2011 – temia-se a captura do ocupante do cargo por interesses de grandes empresas. Fazia sentido adotar tal precaução, quando a SG representa a ponta de lança da política antitruste para combate a monopólios e lucros ilegais.
Passados cinco anos da entrada em vigor da nova legislação, porém, não há notícia de que isso aconteceu a Carlos Emmanuel Ragazzo, o primeiro ocupante do cargo que substituiu a extinta Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça, e agora a Eduardo Frade. A solução legislativa foi limitar a dois anos o mandato de superintendente-geral – metade dos quatro anos que têm os conselheiros.
Pelo contrário, grandes empresas e advogados engrossam queixas à rigidez e dureza de pareceres e análises da SG – contrapostas por avaliações econômicas e jurídicas de base técnica e justificativas claras.
Ainda que algumas visões da superintendência sejam questionadas no Judiciário, não há denúncias ou suspeitas de que tenha agido a serviço deste ou daquele grupo econômico, mas em prol da concorrência e do livre mercado. O valor das multas sugeridas pela SG tem aumentado. Ao mesmo tempo em que, a legislação reduziu de 0 a 30% para 0,1% a 20% do faturamento bruto das empresas os limites para sanção. O aumento nas cifras é alvo de muita reclamação de advogados especializados nos bastidores.
Há expectativa de que neste ano o Cade aplique cerca de R$ 1 bilhão em penalidades – a maior parte disso por meio de acordos com investigados.