Reforma Tributária

Cinco problemas do mundo real que reforma tributária terá de enfrentar

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Capítulo 1

Entenda como propostas tratam de disfuncionalidades do sistema tributário

Regras e alíquotas complexas. Contencioso elevadíssimo. Um sistema com alto grau de regressividade — que proporcionalmente pesa mais para quem ganha menos. Concessões de incentivos fiscais que potencializam a guerra fiscal.
Os tópicos acima são apontados por especialistas como os principais problemas do nosso sistema tributário. Todos eles estão na pauta do dia com o avanço das discussões sobre uma possível reforma tributária.

Atualmente, são quatro as principais propostas de reforma. Duas delas tramitam no Congresso por meio das propostas de emenda à Constituição (PECs) 45 e 110, de 2019. O governo também prepara um texto e, recentemente, o Instituto Brasil 200, que reúne empresários favoráveis ao presidente Jair Bolsonaro (PSL), criou um manifesto em prol de uma reforma tributária.

Em menor ou maior escala, os projetos apostam na unificação de tributos como forma de reduzir os principais problemas do sistema atual. Pelo menos dois deles – os que tramitam na Câmara e no Senado – preveem a possibilidade de creditamento integral sobre o que foi pago em tributos nas etapas anteriores como forma de chegar a um sistema, de fato, não cumulativo.
Criar um modelo adequado, porém, não é o suficiente para alterar o sistema atual. Fatores como falta de apoio no Legislativo e o temor dos estados e municípios de perder arrecadação também pesam.

Em entrevista ao JOTA, o economista Marcos Lisboa, presidente do Insper, explicou as consequências dos principais problemas do sistema tributário brasileiro na economia. Na sequência, o JOTA aponta como as propostas de reforma tributária lidam com cada um deles.

Capítulo 2

1. Grande disfuncionalidade do sistema tributário gera má alocação de capital

Estrutura tributária brasileira induz as empresas a usar mal os recursos da sociedade

Marcos Lisboa: “O país ficou mais pobre nesta década e uma das causas é a disfuncionalidade do sistema tributário. A estrutura tributária brasileira induz as empresas a usar mal os recursos da sociedade. Elas deveriam produzir onde vão gerar maior valor. Vamos usar o exemplo de uma fábrica, em que as peças e equipamentos são produzidas em São Paulo e cujo público consumidor está em São Paulo. O que o empresário faz? Monta a fábrica em Manaus, por causa dos incentivos. Assim, o país desperdiça recursos mandando insumos para lá, voltando com o bem produzido para São Paulo. O resultado em um imenso custo de logística. Isso significa que você gasta muito mais recursos da sociedade para fazer o mesmo bem.

 

A evidência indica que entre os fatores que influenciam a menor produtividade de um país, de 40% a 60% dessa responsabilidade vem da má alocação de capital (misalocation of capital). Ou seja, colocar os recursos no lugar errado ou proteger empresas menos produtivas é uma parte importante da explicação de porque o Brasil é pobre. O Nordeste tenta se desenvolver atraindo fábricas há quase 60 anos e não funciona. É preciso outra estratégia para se combater a desigualdade regional.”

Como resolver?

PEC Câmara

A PEC 45/2019, apresentada pelo deputado Baleia Rossi (MDB-SP), sugere a substituição dos cinco tributos hoje incidentes sobre o consumo (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS) pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). A PEC também autoriza que as empresas tomem crédito sobre todo o valor pago na etapa anterior da cadeia produtiva, englobando todas as despesas para o funcionamento da companhia. A sistemática de créditos, assim, concentraria a cobrança dos tributos no destino, o que, segundo o Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), promoveria uma incidência neutra, sem influenciar a forma como as empresas decidem se instalar no país. 

Ou seja, independentemente de como se organizam a produção e a distribuição das mercadorias, os consumidores pagam na etapa final o tributo recolhido ao longo da cadeia, e a arrecadação vai para o estado onde está o mercado consumidor. De acordo com defensores das alterações propostas pela PEC, o tributo único reorganizaria a tributação do consumo para o destino, de forma que a arrecadação dependesse apenas da localização do consumidor, e não do local em que estão sediadas as empresas.

Nessa lógica, para os estados incentivarem um aumento na arrecadação, faria mais sentido investirem em políticas públicas para desenvolver a região e fomentar o consumo. Segundo defensores da proposta, não faria sentido conceder benefícios fiscais a empresas, pois o tributo não seria cobrado na produção. 

PEC Senado

De forma semelhante à PEC de Baleia Rossi, a PEC 110/2019, apresentada pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), permite a tomada de créditos sobre todos os bens e serviços consumidos nas etapas anteriores. O texto de Alcolumbre, baseado no relatório do ex-deputado Luiz Carlos Hauly para a PEC 293/2004, também introduz a lógica da cobrança do imposto apenas no local de destino. 

Proposta do governo

O secretário da Receita Federal, Marcos Cintra, afirmou em entrevistas que propõe unificar IPI, PIS, Cofins e parte do IOF em um único tributo federal, o Imposto Único Federal (IUF), e criar uma contribuição sobre pagamentos, que seria cumulativa. Não foi esclarecido, entretanto, como seria feito o creditamento do IVA federal caso a proposta fosse adotada.

Instituto Brasil 200

O imposto único proposto pela organização, que incidiria automaticamente sobre movimentações financeiras, substituiria todos os tributos que existem no Brasil atualmente – tanto os federais quanto os estaduais e os municipais.

O presidente do grupo, Gabriel Kanner, afirmou que o imposto seria cobrado sobre qualquer transação financeira entre contas correntes, com uma alíquota de 2,5% para as duas pontas – do lado de quem paga e de quem recebe. No caso dos saques, a alíquota seria dobrada, de 5%, para tributar as compras em dinheiro.

O imposto seria cumulativo, eliminando o sistema de compensação de créditos e débitos. Não ficou explícito se o instituto estuda como resolver o misalocation of capital.

Complexidade

2. O sistema atual é complexo, gerando um grande contencioso judicial e administrativo

Levantamento mostrou que processos administrativos do Carf e Receita representavam 12% do PIB

Marcos Lisboa: “Há no Brasil vários impostos indiretos com critérios diferentes, que variam entre categorias, estados, regimes de compensação, exceções, micro-exceções. O sistema é caótico e tão complexo que há muita incerteza sobre as regras. Pelo fato de o sistema ser muito complexo, há muita margem de interpretação, muita dúvida, e isso resulta em um contencioso imenso. Hoje interpreta-se de um jeito e amanhã de outro. Um levantamento feito em 2014, só na Receita Federal e no CARF, mostra que os processos administrativos representavam 12% do PIB. Numa amostra de 17 países, incluindo países desenvolvidos e emergentes, a mediana fica em 0,2%. A diferença de 60 vezes mostra que há algo de muito errado por aqui.

 

Além disso, a nossa lei é muito mal escrita, permite muitas interpretações, com muita criatividade. O órgão de governo interpreta a norma, fiscaliza, autua as empresas e tem o voto duplo no tribunal administrativo. Como você pode julgar? Você é parte interessada. Quer piorar? Auditores defendem ganhar um bônus que depende do total arrecadado”.

Como resolver?

PEC Câmara

Por meio da PEC 45/2019 os autores pretendem simplificar o sistema atual permitindo que o IBS tenha uma alíquota única para todos os bens e serviços em cada localidade. A alíquota total do IBS seria definida pela soma entre as alíquotas estabelecidas pela União, pelo estado e pelo município onde está o consumidor.

A alíquota total do IBS seria uniforme para todos os bens e serviços dentro de cada cidade. Nas transações interestaduais, seria adotada a alíquota do destino.

A ideia do texto também é acabar com o litígio tributário relacionado à classificação fiscal – ou seja, a disputa das empresas com o fisco para descobrir como se categoriza cada bem ou serviço, a fim de tentar reduzir a carga tributária devida. 

Além disso, os autores defendem que o sistema de créditos proposto permite que o imposto pago pelo consumidor final seja igual ao valor que foi recolhido ao longo da cadeia, o que resultaria em um regime não-cumulativo, com menos disputas judiciais sobre quais itens geram crédito e quais não dão direito ao creditamento.

PEC Senado

O texto vindo do Senado também permite a tomada de créditos sobre todos os bens ou serviços nas etapas anteriores. Entretanto, diferentemente da PEC da Câmara, a do Senado permite que cada bem ou serviço tenha uma alíquota diferente do IBS. A alíquota de um determinado bem ou serviço seria a mesma em qualquer lugar do país, porém, bens ou serviços muito parecidos podem estar sujeitos a alíquotas distintas.

O fato, segundo críticos, poderia manter as elevadas disputas judiciais em relação à classificação fiscal das mercadorias. Além disso, a possibilidade de alíquotas variadas incentivaria que categorias atuem  no Congresso para favorecer a própria tributação.

Proposta do governo

A proposta do governo não tem texto formalizado, e não está claro como seria o sistema de créditos, débitos e alíquotas do Imposto Único Federal. Em entrevista ao JOTA em maio, o procurador-geral da Fazenda Nacional (PGFN) afirmou que uma reforma tributária que reduza o número de tributos e simplifique a legislação facilitaria a compreensão das empresas sobre as regras para pagar tributos, podendo reduzir a judicialização.

Instituto Brasil 200

A retenção do imposto único proposto pela organização seria feita automaticamente pelos bancos, sem necessidade de os contribuintes preencherem uma guia para declarar os tributos devidos, o que simplificaria o sistema. A arrecadação seria depositada em parte na conta corrente do Tesouro Nacional e em parte seria destinada à Seguridade Social.

O imposto seria cumulativo, eliminando o sistema de compensação de créditos e débitos. Ainda, segundo Kanner, com a unificação dos tributos as vantagens para as empresas seriam a redução no custo de conformidade para cumprir as regras do sistema atual e a queda nas disputas judiciais e administrativas.

Capítulo 4

3. A carga tributária brasileira atualmente é alta, com uma multiplicidade de alíquotas

Essa discussão é dividida entre a parte política e a econômica

Marcos Lisboa: “Separo a discussão entre a parte política e a econômica. Política é para fazer escolhas para a sociedade. Alguns vão preferir um país com maior Estado, maior proteção social — mesmo que isso signifique crescer menos. Outros vão querer um país com menos impostos, com menos proteção social, mas que cresça mais. De um lado, temos os Estados Unidos, do outro, alguns países europeus. É uma discussão legítima sobre a qual os economistas não tem nada a dizer. E a discussão sobre a carga tributária está inserida nesse rol.

 

A segunda discussão é sobre a ineficiência e a falta de racionalidade — esse é um debate para os economistas. Por exemplo: entre o lucro contábil que a empresa tem e o lucro que é tributável, tem uma quantidade de adições e subtrações que é impressionante. Uma confusão. São dois os tributos sobre o lucro, o IRPJ e a CSLL, que não são iguais. Há uma série de questões envolvendo lucros no exterior. É caótico e bem contrário ao que o resto do mundo faz. Isso prejudica o crescimento do Brasil.

 

Existe o mito de que dividendos não pagam tributos. Aqui, há uma pegadinha. O lucro das empresas pertence aos acionistas e são tributados quando são gerados na empresa. Dividendo é o lucro distribuído aos acionistas, que já pagou tributos. Nada diferente do que ocorre com os trabalhadores, que tem seu imposto devido retido na empresa antes de receber seu salário.”

Como resolver?

PEC Câmara

A proposta permite que cada estado e município defina uma alíquota única de IBS, que valeria para todos os bens e serviços comprados naquele estado e naquele município. Seria possível, assim, que um mesmo bem ou serviço esteja sujeito a alíquotas diferentes dependendo do estado em que está o consumidor. 

A ideia da proposta é aumentar a eficiência do sistema mantendo a carga tributária atual. Isso porque políticos como o presidente Jair Bolsonaro sinalizaram que os contribuintes não devem aceitar um aumento de tributos. Além disso, a crise fiscal impediria o governo de reduzir a própria fonte de receitas.

Entretanto, o economista Bernard Appy, do CCiF e mentor da proposta, afirma que a simplificação nas regras tributárias aumentaria a eficiência e provocaria aumento no PIB potencial brasileiro de no mínimo 10% em 15 anos. Isso significa que a mesma carga tributária no novo sistema geraria uma arrecadação 10% maior do que se fosse mantido o sistema atual.

PEC Senado

De forma semelhante à proposta de Appy, o texto não alteraria a carga tributária atual, pela resistência dos contribuintes a um aumento de tributos e por conta da crise fiscal. 

A PEC delega ao Congresso Nacional a definição das alíquotas. O modelo define que um mesmo bem ou serviço terá uma única alíquota no país todo. Porém, permite que o Congresso mantenha uma multiplicidade de alíquotas de acordo com a classificação fiscal de cada bem ou serviço, o que pode manter as disputas judiciais.

Proposta do governo

Por enquanto, o Ministério da Economia não apresentou a proposta oficialmente nem se pronunciou sobre seus possíveis impactos econômicos.

Instituto Brasil 200

O Instituto Brasil 200 estima que, para todos os 128 setores produtivos, a carga tributária cairia pela metade no modelo do imposto único. A arrecadação do governo continuaria a mesma porque, segundo Kanner, seriam eliminadas isenções e seria impossível sonegar o imposto único. “Conseguimos baixar tanto a alíquota porque todo mundo vai começar a pagar”, disse.

Capítulo 5

4. Há um cenário de guerra fiscal, gerado principalmente pela possibilidade de concessão de incentivos fiscais

Como, no Brasil, parte dos tributos é cobrado na produção, há o incentivo à guerra fiscal

Marcos Lisboa: “O nosso sistema tem uma característica disfuncional adicional. Os impostos indiretos incidem sobre o consumo, mas, em muitos casos, são cobrados onde o bem é produzido, não onde ele é consumido. O consumidor de Sergipe que consome um bem produzido em São Paulo tem parte do seu imposto pago para o governo de São Paulo, não Sergipe.

 

Não é essa a boa prática nos demais países. O tributo sobre consumo deve ser pago onde reside o consumidor final. Por isso mesmo, a prática nos países é não tributar as exportações, e sim tributar as importações.

 

Como, no Brasil, parte dos tributos é cobrado na produção, há o incentivo à guerra fiscal, que destruiu a base de arrecadação.

 

Hoje cada empresa paga um tipo de tributo diferente e isso tem a ver com a descentralização das competências tributárias. Os 26 estados e o Distrito Federal podem regulamentar o ICMS. As empresas hoje fazem redesenho de malha. Você muda a fábrica ou o centro de distribuição de lugar para aproveitar incentivos fiscais. As empresas de medicamentos saem de São Paulo com um caminhão, vão para Goiás, onde tem incentivo para distribuição de medicamento, trocam nota fiscal, no que é chamado cross-docking, e voltam com a mercadoria.

 

Usamos as políticas erradas para resolver problemas regionais. Tem que fazer política regional de desenvolvimento, mas não é assim que se faz, dando incentivo tributário. Essa não é eficaz, já vimos que não funciona. O Brasil está, há 60 anos, dando quimioterapia para perna quebrada”.

Como resolver?

PEC Câmara

Segundo defensores, o modelo proposto na PEC eliminaria isenções ou regimes especiais de PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS, já que prevê a extinção dos tributos que hoje permitem esses benefícios. Entre os incentivos que seriam eliminados está o tratamento tributário diferenciado da Zona Franca de Manaus.

De acordo com os apoiadores da proposta, a arrecadação segundo o princípio do destino levaria ao fim da guerra fiscal. Como a receita vai para o estado onde está o consumidor, não faria sentido os estados promoverem incentivos fiscais para as empresas. Assim, em vez de atrair companhias com base em incentivos fiscais, segundo Appy, seria mais interessante que os estados desenvolvessem suas regiões por meio de políticas públicas, como de infraestrutura e educação.

Para administrar o IBS, seria formado um comitê gestor com igual participação da União, dos estados e dos municípios, em composição paritária. As receitas seriam arrecadadas para uma conta centralizada e distribuídas diretamente aos orçamentos dos entes. Com a sistemática os municípios deixariam de depender de liberação dos estados para receberem o dinheiro da cota parte do ICMS, por exemplo.

Tanto a possibilidade de eliminação da Zona Franca de Manaus como a composição do comitê gestor do IBS, entretanto, podem sofrer tentativas de alteração na Câmara. Isso porque o Comitê dos Secretários de Fazenda dos Estados e do DF (Comsefaz) está alinhavando uma emenda à PEC para manter a zona franca e retirar a União do comitê. O texto da emenda ainda precisa ser finalizado e aprovado pelos governadores.

PEC Senado

A proposta também alteraria a forma de rateio dos valores arrecadados, já que a receita pertencerá ao estado onde ocorre a compra dos bens e serviços. Assim, de forma semelhante à PEC da Câmara, a proposta do Senado supostamente deixaria de incentivar a guerra fiscal.

A proposta impede isenções e outros incentivos fiscais. Como exceção, a PEC permite que sejam instituídos incentivos por lei complementar aprovada no Congresso Nacional a seis setores: alimentos, inclusive os destinados ao consumo animal; medicamentos; transporte público coletivo de passageiros urbano; bens do ativo imobilizado; saneamento básico; educação infantil, ensino fundamental, médio e superior e educação profissional. A proposta mantém a tributação favorecida para a Zona Franca de Manaus da forma como ocorre hoje.

Proposta do governo

A proposta que parte do Ministério da Economia unifica apenas tributos federais, sem alterar a tributação que é de competência dos estados e municípios. Segundo interlocutores próximos ao Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), o secretário da Receita Federal avalia que propostas muito abrangentes, que mexam na tributação estadual, vão travar no Congresso. Assim, a ideia de Marcos Cintra seria a de arrumar a casa na esfera federal para incentivar os estados a promoverem a própria simplificação tributária por meio de um IVA estadual.

Instituto Brasil 200

De acordo com a entidade, em princípio a distribuição das receitas entre União, estados e municípios seguiria a proporção atual, mas poderia ser alterada para aumentar o repasse a governos regionais, conforme defende o ministro da Economia, Paulo Guedes.

Capítulo 6

5. É preciso repensar e reorganizar os tributos para ricos e pobres

Melhor uma regra comum a todos os bens e serviços e usar o gasto público para fazer política social

Marcos Lisboa: “Esse debate sobre a regressividade do sistema tributário brasileiro é meio atrapalhado. Começa com a falácia de que os acionistas não pagam tributos e segue na discussão sobre os tributos sobre o consumo, proporcionalmente maior entre os mais pobres.

 

Em primeiro lugar, o lucro dos acionistas paga impostos na origem. Em segundo, a política pública é mais eficaz no gasto do que na arrecadação. Desonerar a cesta básica beneficia tanto o pobre quanto o rico, além de gerar uma interminável discussão sobre que bens devem estar na cesta. Melhor uma regra de tributação comum a todos os bens e serviços e depois utilizar o gasto público para fazer política social, como saúde e educação para a população. Além disso, melhor transferir renda para os mais pobres que sabem melhor do que o governo o que precisam consumir, se roupa, transporte ou qual cesta de bens de consumo.

 

Um terceiro problema é confundir o tamanho da empresa com o tamanho do acionista. Você pode ser um milionário com uma microempresa ou de classe média, mas sócio de uma grande empresa. Alguns dos maiores acionistas dos grandes bancos são fundos de pensão, por exemplo. Você também pode ser um grande advogado que fatura R$ 2 milhões, com uma salinha e uma secretária, e é tributado no simples. Uma empresa que fatura R$ 20 milhões e gera renda para o seu acionista de R$ 6 milhões por ano paga 16%, 18% de imposto, enquanto um pequeno pensionista cujo fundo investe em ações de um banco está pagando 45%.

 

Seria melhor, e evitaria muitas injustiças, uma alíquota menor no lucro gerado na empresa, entre 15% e 20%. Depois o indivíduo que recebe o dividendo calcula a sua renda total e paga o que falta pela tabela do imposto de renda, compensando o que já foi pago na empresa. Dessa forma, garante-se que quem ganhou mais paga mais tributos. Nesse caso, pode-se, inclusive, elevar a alíquota marginal dos mais ricos para 34%.

 

Aliás, a tendência no mundo é migrar para reduzir a cobrança do lucro e tributar os dividendos. Se o Brasil não for no mesmo caminho as empresas nacionais vão ficar ainda menos competitivas. Temos que simplificar, unificar e desenhar um sistema tributário que não desestimule a produção e o investimento, que não incentive utilizar capital e trabalho em empresas pouco produtivas e que dê segurança jurídica, o que reduziria esse contencioso disfuncional. Como tenho dito, não somos pobres à toa. Fazemos um imenso esforço para impedir o país de crescer.”

Como resolver?

PEC Câmara

A proposta do CCiF não promove uma tributação reduzida de bens essenciais como alimentos e cesta básica. Porém, a PEC cria um sistema de devolução personalizada do dinheiro gasto pelas famílias de baixa renda com tributos. Como a isenção da cesta básica beneficia tanto as famílias pobres quanto as de maior poder aquisitivo, o CCiF argumenta que seria mais justo o governo ressarcir apenas as famílias mais pobres, cujos CPFs estiverem inscritos nos cadastros de programas de redistribuição de renda como o Bolsa Família. Seria devolvido o IBS gasto pelas famílias pobres em compras de quaisquer bens ou serviços. A PEC, no entanto, estabelece um teto para essa devolução, que seria definido quantitativamente por meio de lei complementar.

Porém, ao JOTA o ex-secretário da Receita Federal Everardo Maciel criticou este ponto da PEC, por entender que a devolução de recursos por parte da administração tributária costuma ser muito demorada e burocrática, além de estar sujeita a fraudes.

PEC Senado

O texto também prevê a devolução do imposto pago por famílias mais pobres. A administração devolveria o dinheiro gasto com impostos ao cruzar os dados do contribuinte com cadastros de programas de redistribuição de renda.

Segundo um especialista que falou anonimamente ao JOTA, a regressividade do sistema depende de como seriam fixadas as alíquotas para cada bem ou serviço. Se produtos que tipicamente são consumidos apenas por famílias mais ricas tiverem alíquotas mais elevadas, o imposto tende a ser mais progressivo. Entretanto, se as alíquotas mais altas forem estabelecidas sobre bens tipicamente populares, o tributo será regressivo.

A proposta de Alcolumbre só permite que sejam estabelecidas isenções sobre alimentos, medicamentos, transporte público coletivo, ativo imobilizado, saneamento básico e educação. Na avaliação do especialista, estes itens são tipicamente consumidos pelos mais pobres, de forma que o sistema da PEC tenderia a ser mais progressivo do que o atual.

Proposta do governo

A Folha de S. Paulo noticiou que o Ministério da Economia pretende reduzir a alíquota máxima do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) de 27,5% para 25%, limitando, entretanto, as deduções. Segundo o jornal, a alíquota máxima do IRPJ também cairia, de 34% para 25%, e seria elevada a faixa salarial isenta do tributo.

O IRPF é apontado por especialistas como principal mecanismo para reduzir a desigualdade social, porque o governo pode aumentar a carga tributária sobre os mais ricos e diminuir o peso do tributo sobre os mais pobres por meio do controle das alíquotas segundo a faixa de renda. No caso de tributos indiretos, como aqueles que recaem sobre o consumo, esse controle fica mais difícil.

Instituto Brasil 200

Kanner afirmou que, ao longo da negociação política do imposto único, é possível defender a preservação do IRPF, que funcionaria como um mecanismo para reduzir a desigualdade social. Isso porque a Constituição determina que o sistema tributário deve, sempre que possível, ajustar a carga tributária segundo a capacidade econômica dos contribuintes. Como no modelo do Brasil 200 a alíquota seria igual para todos (2,5%) independentemente da renda, o grupo estuda manter o IRPF.

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