Meio Ambiente

Com foco na Amazônia, presidenciáveis têm poucas metas para a agenda climática

Mesmo com a pressão pela preservação da floresta, candidaturas citam apenas o combate ao desmatamento ilegal

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Lago da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará. Crédito: Bruno Batista/VPR

Pela primeira vez, o meio ambiente e a preocupação com a mudança do clima entraram no plano de governo dos quatro candidatos mais bem colocados na disputa presidencial. Em partes, o feito é resultado da pressão internacional, pois países que importam produtos feitos no Brasil começaram a cobrar maior fiscalização ambiental e a garantia de origem da produção. Por outro lado, as diretrizes programáticas se centraram mais no combate ao desmatamento ilegal da Amazônia e apresentaram poucos compromissos e metas com a agenda do clima.

Por outro lado, o desmonte da política ambiental durante o governo Jair Bolsonaro (PL), que levou o índice de desmatamento da Amazônia de agosto de 2021 a julho de 2022 a ser o maior nos últimos 15 anos, colocou a questão da preservação no centro das atenções.

Em resposta às demandas da comunidade internacional e da sociedade brasileira, os planos de governo dos principais candidatos incluíram propostas para a área ambiental. Contudo, a menção a questões relativas ao meio ambiente não significa que as ideias sejam eficientes ou significativas.

Para a especialista em políticas públicas ambientais e presidente do Instituto Talanoa, Natalie Unterstell, “a Amazônia está muito no cerne das políticas ambientais dos candidatos, mas essa narrativa tem poucas propostas ou propostas genéricas de reestruturação e reconstrução do aparato de comando e controle”.

Além disso, a linguagem dos candidatos também fica limitada a detalhes que podem passar despercebidos pelos eleitores mais desatentos. De acordo com o professor-associado da PUC-Rio e diretor-executivo da Climate Policy Initiative (CPI) Brasil, Juliano Assunção, os candidatos falam em acabar com o desmatamento ilegal, quando o foco deveria ser zerar o desmatamento de qualquer tipo, mesmo que dentro da cota permitida por lei.

“Para acabar com o desmatamento ilegal, são necessárias ações de comando e controle. No caso do desmatamento legal, incentivos fortes precisam ser colocados em prática para evitar a supressão de vegetação. O Brasil não precisa desmatar mais nenhuma árvore para avançar na agricultura, por exemplo”, disse Assunção.

O único que foi além do compromisso de combater o desmatamento ilegal é o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que também incluiu em seu programa o compromisso de promover “o desmatamento líquido zero, ou seja, com recomposição de áreas degradadas e reflorestamento dos biomas”.

Até mesmo o plano de governo da campanha de Bolsonaro incluiu ações voltadas para o meio ambiente. Durante a atual gestão, o Brasil teve um aumento de 9,5% das emissões brutas de gases de efeito estufa em 2020, o maior índice desde 2006, considerando que o período foi o início da pandemia de covid-19, durante o qual as emissões globais reduziram 7%.

Para a coordenadora de Políticas Públicas do Greenpeace Brasil, Mariana Mota, o plano de Bolsonaro se mostra descolado da realidade ao se eximir dos dramáticos resultados do governo atual e não apresentar reais soluções para esses fatos. “É um plano que propõe repetir o que passou os últimos anos fazendo, negando a ciência, a crise climática, a fome e a pobreza, o desmatamento ou culpabilizando agentes externos por suas causas”, disse. “Para o problema do desmatamento, por exemplo, seu plano lança dúvidas sobre o trabalho do INPE ao propor novas formas de monitoramento”, completou Mota.

Agenda do clima

Enquanto a Amazônia e o desmatamento ganharam um lugar com maior destaque nos planos de governo, a agenda de clima não teve o mesmo espaço. De acordo com Unterstell, as ações “por uma agenda de descarbonização e resiliência são muito fracas”. “O único que fala explicitamente sobre cumprir metas do Acordo de Paris é o candidato Lula”, explicou. No final ano passado, ao levar as propostas do Brasil para a COP26, Bolsonaro elevou a promessa de reduzir as emissões até 2030, mas omitiu a base de cálculo do corte e acabou acusado por entidades de fazer uma manobra contábil — ou pedalada climática.

Mais recentemente, durante o anúncio de apoio de Marina Silva à candidatura petista, Lula se comprometeu com as demandas de sua ex-ministra do Meio Ambiente, como a criação de uma autoridade nacional para a emergência climática e de envolver todos os ministérios em torno do tema.

No caso do plano de Ciro Gomes, o candidato traz a meta de transição para uma matriz elétrica 100% limpa até 2030, com a Petrobras envolvida nesta transição. Já Simone Tebet citou temas como a economia verde e se comprometeu com o desmatamento ilegal zero, além de citar ações como precificação de carbono para o mercado de carbono.

Para Assunção, a alta do desmatamento foi um dos fatores que fez com que a agenda de energia ficasse mais distante. “A falta de ideias para a questão de energia é a que mais chama atenção. No Brasil, como o desmatamento saiu de controle, outras questões foram colocadas em segundo plano e acabamos seguindo na direção oposta de outros países na questão da energia elétrica”, afirmou.

Além disso, para Assunção, manter o foco das propostas na Amazônia tem um lado positivo, pois demonstra a preocupação com o bioma e com a presença do Brasil na agenda internacional, mas gera um distanciamento das outras regiões do país. “O meio ambiente tem que ser pensado como uma questão de bem-estar. As nossas baías estão poluídas por falta de saneamento básico, e isso afeta diretamente a população brasileira”, afirmou.

Apesar das intenções colocadas nos planos de governo e das promessas, é preciso que as ações sejam colocadas em prática. De acordo com a coordenadora de Políticas Públicas do Greenpeace, os planos são importantes para que os eleitores possam analisar como os candidatos pensam o futuro do país.

“Após décadas de alertas por parte de cientistas sobre a crise climática, é preciso que o próximo governo eleito esteja de fato comprometido em implementar uma reversão concreta nos rumos das políticas ambientais atuais, que passe por priorização orçamentária, coordenação interministerial e ampla participação da sociedade civil para a construção e implementação das políticas públicas”, afirmou Mota.