Eleições 2018

Ciro Gomes e seus mais de 70 processos judiciais

O que esperar das alianças do candidato do PDT: falas recentes atrapalharam ou é estratégia?

Ciro Gomes
Ciro Gomes (PDT) ao lado de Manuela D'Ávila (PCdoB) / Crédito: Tomás Edson/Agência Freelancer/Divulgação

Conhecido por seu temperamento forte, o ex-ministro Ciro Gomes (PDT) responde a 77 processos no Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE). Desse total, 70 são ações civis que pedem indenização por dano moral. Outros processos são queixas criminais contra ele por calúnia, injúria e difamação. Os casos mostram o ímpeto do ex-ministro ao comentar fatos cotidianos, mas não representam impacto em sua pré-candidatura ao Palácio do Planalto.

A equipe do JOTA fez um levantamento dos processos que tramitam contra o pré-candidato nos tribunais superiores e na justiça estadual do Ceará, onde Ciro foi governador. Os crimes de injúria, calúnia e difamação não estão no rol da Lei da Ficha Limpa, que trata da inelegibilidade dos candidatos. Por esse motivo, mesmo que Ciro Gomes venha a ser condenado em alguma das ações criminais a que responde no Ceará, seu domicílio eleitoral, o ex-ministro poderá registrar sua candidatura nas eleições de outubro.

Em caso de condenação depois de eleito, se isso vier a ocorrer, a Constituição estabelece no artigo 86 que o presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções.

Apesar de as ações contra Ciro não terem potencial para tornar seu nome inelegível nas urnas, a quantidade de processos que tramita contra o pré-candidato supera a média dos demais postulantes ao Palácio do Planalto. Chama a atenção a quantidade de ações criminais relacionadas aos delitos de injúria, calúnia ou difamação e as ações cíveis pedindo indenizações por danos morais a partir de falas de Gomes. O estilo beligerante de Ciro faz com que ele seja também autor de 10 ações que pedem indenizações por danos morais de variados políticos da região, como o presidente do Senado Eunício Oliveira (MDB-CE), além de duas queixas-crime.

O único processo que poderia representar algum risco à candidatura de Ciro Gomes era a ação civil pública por improbidade administrativa, proposta pelo Ministério Público Federal (MPF), alegando haver irregularidades na implantação do Serviço de Atendimento Móvel de Urgências (Samu) no interior do Ceará quando Ciro Gomes era secretário da Saúde. A ação, porém, foi extinta em 2016 na primeira instância da Justiça Federal sem resolução do mérito. A Justiça Federal entendeu que não seria de sua competência o julgamento do caso.

Ataques

O rol de ações contra Ciro por ataques verbais reúne episódios distintos. Em 2012, por exemplo, ocorreu uma greve de policiais no Ceará. Em um programa da TV Diário, Ciro se referiu aos grevistas como “marginais fardados aliados a traficantes e covardes” e foi processado pela categoria.

Entre os que processam Ciro por calúnia estão o presidente Michel Temer (MDB), o ex-deputado federal Eduardo Cunha, em casos que tramitam em Tribunais Superiores, e o ex-prefeito de São Paulo, João Doria, no Tribunal de Justiça de São Paulo.

Temer acionou a Justiça depois que Ciro o classificou de “capitão do golpe”, em entrevista a um programa de televisão. Condenado a pagar R$ 30 mil na 1ª instância, Ciro recorreu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) pedindo nulidade do acórdão ou, alternativamente, que o STJ julgue a ação do Michel Temer improcedente.

Em março deste ano, o pré-candidato Jair Bolsonaro (PSC-RJ) processou criminalmente Ciro Gomes por uma entrevista que ele concedeu no programa “Pânico na Rádio”, na Jovem Pan FM – em que acusou o deputado de ter cometido o crime de lavagem de dinheiro ao repassar para seu partido o valor de R$ 200 mil recebidos da JBS.

Em 2013, Ciro Gomes classificou o procurador da República Oscar Costa Filho de “exibicionista, politiqueiro, irresponsável, mentiroso e tresloucado”. O procurador investigou suspeitas de irregularidades na Secretaria de Saúde do Ceará, que era governado por Cid Gomes, irmão de Ciro. No caso, o Ministério Público Federal (MPF) ofereceu denúncia contra Ciro Gomes pelos supostos crimes de difamação e injúria.

O Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5) entendeu não haver dolo para a configuração dos crimes, então, o MPF interpôs recurso especial no STJ que foi inadmitido pela vice-presidência. Na última movimentação, o MPF apresentou agravo ao RESp que aguarda o voto do relator, ministro Nefi Cordeiro.

O processo criminal que Eduardo Cunha move contra Ciro também foi rejeitado pelo TRF5, mas Cunha recorreu ao STJ pedindo que a decisão seja revista.

Lava Jato

Ciro Gomes não aparece entre os supostos beneficiários de pagamentos fruto de corrupção, de acordo com as investigações da Operação Lava Jato. Mas, no ano passado, a delação da JBS alcançou o ex-governador Cid Gomes, irmão e um dos principais articuladores da campanha presidencial de Ciro. Segundo Wesley Batista, Cid teria negociado a liberação de créditos de ICMS da empresa Cascavel Couros, do grupo JBS, em troca de doações milionárias à campanha de Camilo Santana ao governo em 2014.

O empresário sustenta que o ex-governador teria procurado pessoalmente o grupo e o esquema teria sido operado também em 2010. O caso está na Justiça Federal do Ceará.

Após a divulgação da colaboração, Cid Gomes chegou a solicitar abertura de inquérito contra o delator por ele ter omitido pagamentos feitos nos três anos anteriores à eleição, de R$ 41 milhões em créditos de ICMS, mas a medida não teve andamento. A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, considerou que o relator recorreu a uma figura de linguagem  quando disse que o Estado não pagou um centavo, quando na verdade recebeu R$ 41 milhões no período de três anos.

Alianças de Ciro Gomes

O PDT, partido de Ciro, busca apoio de partidos mais alinhados à “esquerda” para viabilizar o nome do pré-candidato – especialmente o PSB e o PCdoB – no primeiro turno. Além disso, lideranças do partido procuraram – e foram bem recebidos –  por nomes do DEM e do PP, que têm articulado juntos suas posições.

A articulação repercutiu mal nos setores mais tradicionais do PDT e bombeiros da legenda foram chamados para argumentar que as conversas miravam em uma aliança para um segundo turno e, inclusive, na futura governabilidade em caso de eleição.

A ala mais tradicional do partido não se deu por convencida e insiste que as alianças de Ciro devem ser firmadas com a esquerda no primeiro e no segundo turno, porque este grupo entende que o PDT será herdeiro de parte do espólio de Lula. E no segundo turno, a aliança com o PT então, será inevitável. A ala mais pragmática do partido, que defende alianças ao centro já no primeiro turno, argumenta que o tempo de TV é o fiel da balança na curta campanha de 2018 e que em nome da vitória uma aliança com setores do Centro e da Direita seria bem-vinda.

Não há consenso no PDT sobre o tema, mas Ciro em mais uma de suas declarações fortes desqualificou DEM e PP ao dizer que a aliança preferencial é que com o PSB e PCdoB, legendas intelectual e moralmente mais próximas dos pedetistas. À primeira vista, a declaração sinalizou a decisão de queimar pontes com o centro, mas um olhar mais acurado revela que o pré-candidato do PDT – que já saiu em defesa de si mesmo minimizando a importância das próprias palavras – pode estar em busca de uma saída honrosa para um eventual adiamento da aliança para retomar as conversa em um segundo turno, se necessário.

Deliberada ou não, a declaração de Ciro repercutiu mal no DEM e no PP. Rodrigo Maia também não quis queimar pontes com o PDT, mas afirmou de público que seu aliado “natural” seria o PSDB. E o PSDB ainda mantém as conversas com setores do MDB. Já Ciro fala abertamente que se aceita uma aliança com qualquer um, menos com o MDB de Temer.

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