INOVAÇÃO

Com software customizado, govtech agiliza fluxos burocráticos de prefeituras

Serviço do Aprova Digital reduziu de 90 para 10 dias prazo para emissão de alvará de obras em Mogi das Cruzes

TST tomadoras e prestadoras terceirizados
Crédito: Pixabay

“Estava impensável ver como o mundo evoluiu e nós ainda aprovando projetos como há 50 anos atrás”. Essa frase resume o incômodo que motivou o secretário de Planejamento e Urbanismo de Mogi das Cruzes, Claudio Rodrigues, a mapear possíveis soluções para resolver um problema em comum de todas as cidades brasileiras: a morosidade no processo de licenciamento de obras e reformas.

Atualmente, para se conseguir um alvará no Brasil, o prazo médio varia entre 70 e 120 dias, a depender do nível de exigência da legislação municipal. O período é extenso porque o processo é complexo. Para o arquiteto responsável pela obra, são requeridas dezenas de documentações, incluindo a impressão das plantas em grandes formatos, que devem ser protocoladas e entregues de forma presencial nas prefeituras.

Depois, as folhas de papel são registradas e encaminhadas ao setor responsável, que passa à fase de análise da documentação para decidir se autoriza obra. A primeira resposta do órgão no processo, para confirmar se os documentos estão corretos, costuma chegar cerca de vinte dias depois. Apesar da inegável evolução tecnológica, praticamente todas as etapas desse processo ainda são feitas de forma analógica.

A busca de Rodrigues, de Mogi das Cruzes, por uma saída para esse problema encontrou resposta na govtech Aprova Digital, startup fundada em 2017 pelo arquiteto Marco Antonio Zanatta, de Cascavel, cidade do oestte do Paraná. O objetivo da startup é digitalizar os fluxos das prefeituras de todo o país, a partir de um software customizado.

Inicialmente, o negócio surgiu para oferecer soluções de software focadas no licenciamento de obras e reformas. Com o uso do sistema, todas as etapas desse processo se tornam digitais, o que reduz drasticamente o tempo de resposta das solicitações. Desde que Mogi das Cruzes passou a utilizar o sistema, em meados de 2019, a liberação dos documentos passou de 90 dias, em média, para 10. Já os deferimentos mensais saltaram de 44 para 115, enquanto o tempo para a primeira resposta caiu de 15 dias para 2 dias.

“O que fizemos aqui não foi só passar um processo administrativo do papel para o digital. Nós modificamos toda a cultura e a forma com que a solicitação de alvará é analisada”, explica Rodrigues. “Redesenhamos o setor e toda a cadeia de servidores. Também fizemos muito treinamento e capacitação tanto com a nossa equipe técnica, quanto com os profissionais que protocolam os pedidos. Isso dinamizou o processo e hoje ninguém mais precisa vir fisicamente à prefeitura para isso.”

Outro diferencial do sistema, segundo avaliam os gestores públicos que utilizam a plataforma, é o fato de o programa ser customizável de acordo com as regras de cada município. O fato de todos os documentos ficarem armazenados em nuvem também é benéfico, uma vez que elimina a necessidade de se comprar servidores físicos que ficam ociosos boa parte do tempo.

“Para o licenciamento, o Aprova Digital é muito interessante, primeiro, porque já foi pensado pra isso desde o começo, o que faz toda a diferença. Quando o sistema não é desenvolvido para esse fim é preciso fazer uma série de ajustes e ele sempre está parcialmente entregando aquilo que você precisa, mas não exatamente”, diz Henrique Pougy, servidor responsável pela gestão do sistema na Prefeitura de São Paulo.

“Em segundo lugar, com o Aprova Digital conseguimos customizar as demandas em vez de ter que desenvolvê-las toda vez que a legislação muda. O fato de ser um sistema que roda em nuvem também é um grande ganho, porque essa arquitetura não é nem o futuro, já é o presente no mercado privado”, afirma.

Na capital de São Paulo, o software começou a ser utilizado em junho do ano passado, após doação do sistema pela Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis Comerciais e Residenciais de São Paulo (Secovi-SP) e Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo (Sinduscon-SP).

O investimento das organizações para adquirir o sistema e doar à prefeitura foi de R$ 750 mil. A licença será de uso perpétuo, com o compartilhamento do código fonte do software, que, no futuro, poderá ser atualizado pela própria Secretaria Municipal de Licenciamento e Urbanismo. De acordo com Pougy, as estimativas de economia — de tempo e recursos — durante esse período de uso ainda estão em processo de elaboração.

Expansão de serviços

Após se consolidar no ramo de licenciamento de obras, o software Aprova Digital passou a ser customizado para atender às demandas de outras secretarias. Em Itajaí, cidade de Santa Catarina, o serviço é utilizado também para licenciamento ambiental e para abertura e fechamento de empresas.

“O projeto do Aprova Digital foi contratado, por meio de licitação, no segundo semestre do ano passado, para somar a outras iniciativas de modernização, com o objetivo de tornar Itajaí a cidade mais inteligente do estado de Santa Catarina. Mas, quando decidimos isso, percebemos que teríamos que melhorar os serviços mais procurados no município”, afirma Murilo Sodré, secretário de Tecnologia de Itajaí.

“A partir de um levantamento identificamos que os três tipos de serviço mais demandados pelo cidadão, mas que registravam uma certa demora devido às burocracias, foram justamente alvará de obras, abertura de empresas e licenciamento ambiental. Com base nessa demanda fomos ao mercado procurar essas soluções”, conta.

Atualmente, o Aprova Digital está presente em 26 cidades brasileiras e atende 20 milhões de cidadãos que utilizam os serviços oferecidos. Estão disponíveis hoje, para contratação, sete sistemas de fluxo de trabalho de prefeituras (licenciamento de obras, meio ambiente, comunicação interna, abertura de empresas, recursos humanos, tributos e compras públicas).

Durante a pandemia da Covid-19, que forçou a digitalização em diversos setores da sociedade, a govtech dobrou de tamanho. A meta para este ano é chegar a 70 prefeituras, com foco especial para a região Nordeste. “Como os orçamentos das prefeituras de lá às vezes são menores, eles têm que contratar menos servidores para dar conta de um serviço que não necessariamente é menor. A digitalização poderia automatizar muito o fluxo de trabalho”, diz Henrique Mecabô, diretor de Relações Institucionais do Aprova Digital.

Para ele, apesar de a contratação de software pelo setor público não ser algo novo, o sistema oferecido pelo Aprova Digital transforma a startup em uma especialista em fluxos nichados. “Normalmente, se oferece um serviço para digitalizar toda a prefeitura de uma vez só, mas é tudo mais genérico. No fim do dia, o munícipe ainda vai ter que ir à prefeitura e sair com um canhoto para acompanhar a solicitação no site”, avalia.

Na visão de Claudio Rodrigues, de Mogi das Cruzes, com o uso do sistema é possível se tirar estatísticas mais transparentes e com uma visão urbanística da cidade. “A partir dos dados, começo a entender mais a dinâmica da cidade, como tem sido a valorização do solo, onde dá para se incentivar o desenvolvimento econômico, entre outras informações que não tínhamos antes”, conclui.

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