Fake news

TCU determina suspensão de publicidade do Banco do Brasil em sites e redes sociais

Corte recomenda que CGU identifique veículos aptos a receber publicidade estatal para evitar patrocínio a fake news

Caixa Banco do Brasil
Fachada do Banco do Brasil Crédito: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O ministro Bruno Dantas, do Tribunal de Contas da União (TCU), determinou a suspensão de publicidade do Banco do Brasil no site O Jornal da Cidade Online e em outros sites, blogs, portais e redes sociais que não estejam vinculados a empresas concessionárias de serviços de radiodifusão ou que não sejam jornais e revistas que existam há mais de dez anos. Sua liminar foi referendada, por maioria, pelo plenário nesta quarta-feira (27/5). Leia a íntegra da decisão.

O ministro atendeu a pedido do Ministério Público de Contas. O parquet de contas alegou, com base em reportagens publicadas em diversos veículos, que o secretário especial da Secretaria de Comunicação da Presidência da República Fabio Wajngarten pediu para que o banco revisse a decisão de suspender anúncios em site condenado na Justiça pela difusão de fake news, o Jornal da Cidade Online.

O pedido da Secom foi feito após o vereador Carlos Bolsonaro reclamar no Twitter. A suspensão de anúncios no referido site pelo Banco do Brasil foi motivada por alerta emitido pelo Sleeping Giants Brasil, um movimento criado no Twitter para identificar e avisar empresas que tenham seus anúncios publicados em veículos divulgadores de notícias falsas e conteúdos racistas, com vistas a impedir a monetização de tais canais de comunicação. 

No Twitter, o Banco do Brasil respondeu ao perfil Sleeping Giants que iria retirar a publicidade daquele site. Carlos Bolsonaro então compartilhou a postagem e disse: “Marketing do @BancodoBrasil pisoteia em mídia alternativa que traz verdades omitidas. Não falarei nada pois dirão que estou atrapalhando….. agora é você ligar os pontinhos mais uma vez e eu apanhar de novo, com muito orgulho!”.

Depois deste tuíte, o Banco do Brasil voltou a anunciar no site Jornal da Cidade Online.

Para o Ministério Público de Contas, “tais fatos configuram nítida interferência externa nas decisões da gestão publicitária do banco estatal” e que “causa espécie que uma empresa pública que deve, por força de lei, guiar sua atividade corporativa e mercantil sempre atenta ao interesse público, monetize sites e canais que supostamente desenvolvem atividades antiéticas ou ilegais — como a disseminação de fake news e a prática de desinformação à sociedade, colocando a população em risco sanitário”.

Por isso, o MP pediu que o TCU apurasse as condutas narradas e deferisse liminar para impedir que o Banco do Brasil anunciasse no Jornal da Cidade Online.

Bruno Dantas, relator do pedido, deferiu parcialmente a liminar pleiteada. Em sua decisão, Dantas diz que no dia 6 de maio o plenário do TCU decidiu, por unanimidade, que o Banco do Brasil deve adequar seu regulamento de ações de propaganda e publicidade à norma que “estabelece que não serão analisadas pela Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom) as ações de publicidade de cunho mercadológico não vinculada a políticas públicas do Poder Executivo federal”.

Por isso, se diz de acordo com o Ministério Público ao considerar que é “gravíssima a perspectiva de o acionista controlador – a União – determinar gastos publicitários de uma sociedade de economia mista que possui ações comercializadas em bolsa de valores, acionistas minoritários, regras de governança corporativa e deve estar sujeita a uma disciplina rígida de regulação do mercado de capitais”.

No entendimento do ministro, a possível intervenção da União, controladora do BB, por meio de seu secretário de comunicação, se deu “ao arrepio da lei das estatais, do regulamento da SECOM e das diretivas da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e da própria instituição financeira”.

Para Dantas, é “inaceitável que, no momento histórico em que a civilização busca caminhos para combater a chaga da desinformação coletiva promovida por criminosos que manipulam fatos, cultivam discurso de ódio e atacam símbolos democráticos, uma instituição bicentenária como o Banco do Brasil, que tantos bons serviços já prestou à sociedade brasileira, decida voluntariamente associar sua marca a qualquer veículo, evento, ou campanha promocional sem que esteja assegurada a credibilidade do canal de comunicação e seu compromisso com a divulgação de notícias verdadeiras e fidedignas”.

O ministro destaca que “não basta que o Estado brasileiro contrate campanhas publicitárias, é preciso que a comunicação social dos entes estatais esteja comprometida com valores de verdade, integridade, coerência, ética e defesa da cidadania”. Por isso, defere a liminar para que o Banco do Brasil se abstenha de veicular publicidade no site O Jornal da Cidade Online.

Mas Dantas vai além e determina que deverão ser suspensas todas e quaisquer ações de divulgação e publicidade que possam estar monetizando sites que criam e disseminam notícias falsas, até que o TCU decida definitivamente sobre a matéria.

No âmbito da cautelar, o ministro decidiu que o Estado promova ações para identificar e certificar veículos e canais de comunicação que possam receber recursos públicos para fins de publicação de anúncios.

Por isso, “sendo uma tarefa complexa e necessariamente de cunho imparcial e observando a necessidade de auto-regulamentação do setor”, o ministro entende que essa tarefa deve ser feita pela Controladoria-Geral da União, com a participação de outros órgãos, em especial da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, da Secretaria de Comunicação Social do Supremo Tribunal Federal e do Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional, bem como de entidades da sociedade civil.

Algumas entidades civis citadas são a Associação Brasileira de Imprensa (ABI), a Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ), a Associação Brasileira de Jornalistas Investigativos (ABRAJI), a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV (ABERT), Associação Nacional das Editoras de Revistas (ANER), a Associação Nacional dos Jornais (ANJ) e o Instituto Palavra Aberta.

Até que seja formalizado o normativo contendo protocolos de certificação de sites, blogs, portais e redes sociais aptos a receber recursos públicos via anúncios publicitários e congêneres, ficam suspensos todos os contratos de
publicidade do Banco do Brasil com veículos dessa natureza.

Ficam excluídas da determinação de Dantas os portais, sites, blogs e redes sociais vinculados a empresas concessionárias de serviços de radiodifusão, que por serem delegatárias de serviço público, já foram escrutinadas quanto aos critérios de interesse público da informação que veiculo, além dos sites de jornais e revistas que existam há mais de dez anos.

Julgamento

Após três horas de debate, o plenário do TCU referendou, por cinco votos a três, a cautelar concedida pelo ministro Bruno Dantas. Ele foi acompanhado por Raimundo Carreiro, Ana Arraes, Vital do Rêgo e Aroldo Cedraz.

Os demais ministros do TCU entenderam, porém, que não cabe à Corte de Contas fazer esse tipo de análise sem a indicação objetiva de outros sites. Tal competência caberia ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Dessa forma, seguindo o voto do ministro Walton Alencar, ficaram vencidos os ministros Benjamin Zymler e Augusto Nardes. Eles optaram por limitar a cautelar somente ao site Jornal da Cidade Online, origem do imbróglio.

Discordando da amplitude da proposta de Bruno Dantas, o ministro Walton Alencar Rodrigues afirmou que, com a cautelar, negócios jurídicos seriam interrompidos, o que causaria muito transtorno.

“Nossa competência, segundo vejo, não pode limitar gastos publicitários do BB na internet”, votou Rodrigues. “A outorga constitucional ao TCU delimita o âmbito da gestão exercida por nós nos entes estatais.”

O ministro Benjamin Zymler seguiu o voto de Walton Alencar. De acordo com Zymler, o TCU não pode limitar a publicidade do BB em todos os sites e blogs a partir da presunção de que eles divulguem notícias falsas. “Há liberdade dos órgãos de escolher quais os veículos serão destinados suas propagandas”, disse.

“Não fica claro que o Tribunal tenha competências para uma determinação com tal amplitude”, votou o ministro, elogiando o voto de Bruno Dantas. “Se o senhor estivesse no STF, produziria uma das peças mais interessantes que já pude ler.”

Além de impor restrições à cautelar, o TCU também alterou proposta inicial que determinava à Controladoria-Geral da União (CGU) promover ações para identificar e certificar veículos e canais de comunicação que possam receber recursos públicos para fins de publicação de anúncios.

“Não sei se é de nossa competência determinar a um órgão que, no prazo determinado, elabore norma para regular o Banco do Brasil. Parece que estamos extrapolando nossas competências em relação a esse tema”, afirmou Walton Alencar Rodrigues.

Em nota, o Banco do Brasil disse que “não incentiva a disseminação de fake news, ao mesmo tempo em que não condiciona a exibição de suas propagandas comerciais à concordância editorial com os conteúdos divulgados por qualquer veículo de comunicação”. Leia a nota na íntegra abaixo:

O Banco do Brasil S.A. (BB), tendo em vista as notícias veiculadas nesta data que fazem referência à decisão do Tribunal de Contas da União, esclarece:

  1. Qualquer veiculação de publicidade e propaganda do BB é realizada por meio de agências de publicidade contratadas por licitação pública, conforme Leis ns. 12.232, de 2010 e 13.303, de 2016, que por sua vez contratam ferramentas de mídia programática responsáveis por impulsionar campanhas mercadológicas. 
  2. Cabe a essas ferramentas de mídia programática a alocação de conteúdo nos veículos digitais e páginas na internet que serão utilizadas para cada campanha, de acordo com o perfil de público pretendido, respeitando-se, sempre, os interesses mercadológicos, princípios da marca e de ética do BB. 
  3. A análise de uma das ferramentas específicas contratada pelas agências, demonstra que se impulsiona, em média, anúncios em 10 mil páginas distintas na internet para cada campanha do BB. De acordo com relatório extraído da referida ferramenta, o valor médio destinado a cada site é relativamente baixo. Como exemplo, em relação ao site Jornal da Cidade Online, que foi tema de matérias recentemente publicadas pela imprensa, o valor de mídia adquirido desde janeiro de 2019 totaliza R$ 2.856,06. 
  4. Cabe esclarecer que na última terça-feira, dia 19, após alertas recebidos em ambiente virtual, o BB optou por solicitar à ferramenta contratada, por precaução, a suspensão do anúncio no referido site e verificar denúncias relacionadas à veiculação de notícias falsas, o que poderia contrariar princípios éticos do BB. 
  5. Posteriormente, após análise técnica, o BB decidiu por rever a suspensão. O BB considerou em sua decisão as políticas declaradas pela própria ferramenta de impulsionamento que não permitem a veiculação de anúncios em sites que façam declarações falsas, disseminem conteúdos enganosos ou omitam informações. Ademais, a própria ferramenta estabelece como sua missão oferecer aos seus usuários informações confiáveis, bem como se compromete a agir diariamente para minimizar conteúdos que violem suas políticas e impedir ação de pessoas mal intencionadas em sua rede. 
  6. O BB acrescenta que suas diretrizes de marca vedam qualquer exposição em páginas que veiculam conteúdo ilegal, que evidenciem preconceito ou discriminação de qualquer espécie, relacionados à atividades com má reputação ou que de qualquer forma ferem os princípios éticos da Companhia. Estas diretrizes devem ser cumpridas por qualquer contratado, direto ou indireto. Ainda assim decidiu-se iniciar um estudo interno para aprimorar critérios para exibição da marca em veículos digitais. 
  7. O BB não incentiva a disseminação de fake news, ao mesmo tempo em que não condiciona a exibição de suas propagandas comerciais à concordância editorial com os conteúdos divulgados por qualquer veículo de comunicação. O BB respeita, por definição, a liberdade editorial dos veículos em que exibe suas campanhas comerciais, desde que respeitados limites éticos e diretrizes da marca. 
  8. Informamos que investimento em comunicação é tema de acompanhamento permanente por meio de indicadores de desempenho e objeto de verificação por parte de órgãos de controle do BB, destacando que todo o dispêndio em publicidade e mídia da Instituição encontra-se à disposição de qualquer cidadão, no seguinte link: https://www.bb.com.br/pbb/paginainicial/compras,-contratacao-e-venda-de-imoveis/compras-e-contratacoes/servicos-depublicidade#/ 
  9. O BB preza pela ampla transparência, prestação de contas adequada e cordial interação com todos os órgãos fiscalizadores e reguladores, sempre no afã de proteger o patrimônio público e em respeito aos princípios constitucionais da Administração Pública. Eventuais recomendações de aprimoramento e melhoria são sempre bem-vindas para o fortalecimento da Instituição. 
  10. Até o momento o BB não recebeu qualquer notificação do Tribunal de Contas da União a respeito das notícias veiculadas, e tão logo seja oficialmente notificado, prestará os necessários esclarecimentos, bem como cumprirá as determinações emanadas da Corte de Contas.