

Ao negar uma medida cautelar para a remoção de dois links com comentários do jornalista Augusto Nunes, da revista Veja, a Justiça de São Paulo considerou que o candidato à Presidência Guilherme Boulos (PSOL) pleiteou uma censura.
Um dos processos diz respeito a um vídeo de maio deste ano em que Nunes classifica Boulos como “o maior gigolô de moradores de ruas” ao comentar o desabamento de um prédio na região central de São Paulo. O caso ainda será julgado no mérito.
“Ainda que, no futuro, os réus possam ser condenados a pagar uma indenização ou a publicar a resposta do autor (o que, nos presentes autos, não chegou a ser requerido), não é lícita a censura pleiteada pelo autor”, escreveu o juiz Domicio Whately Pacheco e Silva, da 1ª Vara do Juizado Especial Cível.
A partir das declarações de Nunes, Boulos ingressou com duas ações indenizatórias com pedidos de obrigação de fazer que foram reunidas no processo 1005670-27.2018.8.26.
Boulos pediu a concessão de medida liminar para que a mídia fosse retirada imediatamente do ar, além de “todo e qualquer conteúdo que contenha manifestação ofensiva” de Nunes, além de pagamento de indenização de R$ 38 mil em cada uma. A Editora Abril, que edita a Veja, teria responsabilidade objetiva, segundo a defesa do psolista.
O jornalista fez comentário de que Boulos é o “único sem-teto do mundo que nunca dormiu na rua nem passou uma única noite nos imóveis que expropria: o general deixa por lá os soldados rasos e vai desfrutar do conforto das casas que ganhou da família”.
Ele também classificou Boulos, líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, como “o mais conhecido gigolô de moradores de rua” e que “terceirizou o estupro do direito de propriedade”.
Em seu pedido inicial, Boulos acusou o jornalista de prática de crimes e ilícitos por suas “falações ofensivas, ilícitas e inconstitucionais”.
Segundo uma das iniciais, com a notícia do incêndio e desabamento de um prédio no centro de São Paulo, Nunes resolveu “caluninar” Boulos. “Embora o Autor seja um dos coordenadores do MTST, fato público e notório, não foi o MTST que ocupou o prédio que veio a desabar. A imprensa toda – inclusive logo após o terrível acidente – já divulgou que a ocupação se deu por outros movimentos”, diz trecho da inicial.
Para a defesa de Boulos, Nunes usou “desavergonhadamente” expressões difamatórias ao qualificar sua candidatura à presidência como “malandra” e ao chamá-lo de “gigolô de moradores de rua”.
“O uso dessas expressões caracteriza o intuito escrachado e desrespeitoso da matéria, que nada de jornalística ou informativa possui, assim definindo-a como difamatória”, diz a inicial.
“Essa ‘notícia’”, apenas travestida de informação, é falsa e procura desacreditar publicamente o Autor, pretendendo tirar-lhe a boa reputação social que usufrui e a honradez que possui. Intenta o primeiro Réu, no website da segunda Ré, de modo ilícito, macular a honra e desqualificar a sua imagem.”
A defesa argumenta que o direito à liberdade de expressão encontra limites. “Tal liberdade (obviamente não absoluta sob pena de privilégio) encontra seus limites na dimensão do respeito e preservação dos direitos alheios. Vale dizer pois, encontra a liberdade e prerrogativa do jornalista ofensor seus limites nos contornos de seu abuso e da ofensa aos direitos de outrem”, alega a inicial.
Contestação
Em contestação, a Editora Abril, representada pelo escritório Fidalgo Advogados, alegou que nenhuma inverdade foi publicada e nenhum ilícito foi atribuído a Boulos no texto.
Segundo a defesa, o verdadeiro motivo da insatisfação do político é o “conteúdo da crítica jornalística, que apesar de ser lícita e pertinente, não lhe pareceu favorável e revelou a sua estratégia de campanha”.
“Foi essa a verdadeira razão pela qual Guilherme Boulos, preocupado com a repercussão negativa da crítica na sua campanha, requereu, em tutela de urgência, a censura imediata do material jornalístico impugnado. Boulos desejava esconder a qualquer custo a crítica manifestada pela imprensa, ainda que lícita e verdadeira”, diz trecho da contestação.
Os advogados também alegaram que o candidato se mostra “repulsivo à atuação da imprensa quando se manifestação com opinião divergente ou desfavorável a ele”. E reforçam que nenhuma inverdade foi apontada por Boulos na Justiça.
“Fica bem claro que toda a argumentação trazida pelo Autor decorre, na verdade, da incapacidade de Guilherme Boulos conviver harmoniosamente com opiniões divergentes”, escreveram os advogados.
A contestação também argumenta sobre o uso da palavra gigolô, que apesar de ser de gosto duvidoso não configura ilícito e deve ser analisado no contexto. Segundo os advogados, o termo “nada mais representa que o indivíduo que depende de outrem” e que este significado tem de ser atribuído ao texto jornalístico.
“Sabidamente, Boulos conta com inúmeros integrantes desses movimentos sociais, que estão à frente da causa que o Autor carrega como base para a sua campanha política à presidência da República. Como político que é, vive dos votos dessas pessoas menos favorecidas e, por isso, não pode se insurgir ou dizer-se ofendido com o emprego dessa expressão num contexto jornalístico crítico”, diz a contestação.
Procurado, via assessoria do PSOL, Boulos não se manifestou até a publicação desta reportagem.