Webinar do JOTA

O que falta para transação tributária nacional se difundir e reduzir litígios?

Ferramenta instituída em 2020 foi criada para promover diálogo entre contribuintes e Fazenda para acerto de dívidas

Foto: Pexels

Como forma de sanar o excesso de litígios tributários que abarrotam tribunais brasileiros, foi sancionada no Brasil em 2020 a Lei 13.988 instituindo a chamada transação tributária, espécie de resolutiva relativa à cobrança de créditos dos contribuintes pelo Fisco. O principal objetivo é que Fazenda e pagadores de impostos dialoguem, e a dívida seja sanada.

Mais de um ano depois da legislação, o instrumento tem espaço para se expandir, opinam especialistas ouvidos na CASA JOTA nesta sexta-feira (26/11) sobre avanços, desafios e perspectivas para a transação tributária.

“Ao longo dos anos, tivemos milhares de teses, com respectivas ‘teses filhote’ sobre as mesmas questões tributárias até se tornar inviável para o Judiciário”, explicou a advogada Fernanda Donnabella Camano, que coordenou a linha de pesquisa na Fundação Getúlio Vargas (FGV) Direito SP para pensar em possíveis temas para transação no contencioso tributário. O projeto foi publicado em série de artigos no JOTA, reunidos em ebook – também encaminhado à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e a outros órgãos técnicos, segundo Camano.

“A instituição da transação tributária se solidificou em um movimento pelo diálogo tomado pela PGFN. Agora, está sacramentado o diálogo entre procuradoria e contribuintes. A transação veio para ficar e prevejo que deve crescer. Não vejo caminho de volta”, disse a advogada.

Além de agir para combater acúmulo de litígios a serem resolvidos pelo Judiciário, a transação tributária poderia ter outros efeitos que comprometem arrecadação e concorrência, na perspectiva de João Grognet, coordenador-geral de Estratégias de Recuperação de Créditos da PGFN.

“A transação se presta a encerrar disputas, com renúncias de ambas as partes. Mas, também serve para sanar os constantes programas de refinanciamento linear, em que não apenas os contribuintes sem condições de pagar se beneficiam, mas outros em boa situação”, afirmou Grognet. “É inegável que isso vulnera a concorrência e mostra que nosso país não é sério o suficiente para receber investimentos”, completou.

A lógica é que o refinanciamento com desconto deve funcionar para receber dívidas de contribuintes que, de outro modo, não teriam como arcar. “Política pública de pagamento com desconto para quem precisa é justiça, mas se torna injusta quando atende quem não precisa. No final, o que não foi arrecadado será repartido entre todos, onerando aquele que está com dificuldade econômica”, pontuou Grognet.

Embora a lei de 2020 trate de transação nacional, esse tipo de política pública poderia se replicar em estados e municípios. Em 2017, Blumenau (SC) iniciou um projeto piloto para aplicar o mecanismo. Hoje, o programa se expandiu e tem a meta de zerar o número de processos do tipo acumulados no município.

“Na nossa vara, tínhamos 67 mil executivos fiscais, sendo 35 mil abaixo envolvendo quantias abaixo de R$ 5 mil. Nós não podíamos mais perder tempo discutindo pequenos valores, fazendo com que os procuradores trabalhassem em algo que não cumpre o principio da eficiência. A adoção de métodos de solução de conflitos veio nesse sentido”, contou Cleide Regina Furlani Pompermaier, procuradora de Blumenau e cocriadora da iniciativa.

O projeto prevê desconto de até 70% no valor principal do tributo devido. Inicialmente, as causas poderiam ser de até 40 salários mínimos e, atualmente, 60 salários. Para não incentivar a inadimplência, a transação poderia ser feita apenas uma vez. São pressupostos para participar e usados no recálculo das dívidas: histórico fiscal do contribuinte, tempo de duração da ação, hipossuficiência do contribuinte, risco de município perder a ação.

“Houve a humanização do processo. Nós ouvimos o contribuinte, por isso muitas vezes ele se sente acolhido. A maior parte dos acordos foi por conta dessa escuta ativa. Até aqui, fizemos 1189 acordos e arrecadamos R$ 3,1 milhões”, contou. Agora, a estrutura funciona como um Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSC), com capacidade de realizar mais audiências semanais.

Como recomendação para outros municípios, a procuradora entende haver necessidade de uma uniformização do instrumento, inclusive com a possibilidade de digitalizar processos visando mais eficiência. “Gostaria que um modelo fosse adotado para que o instituto não venha a ser desvirtuado. Processos abaixo de R$ 5 mil poderiam ser feitos por uma plataforma, por exemplo”, disse.

Sair da versão mobile