Entidades que realizam pesquisas eleitorais no Brasil são obrigadas, por lei, a registrar junto à Justiça Eleitoral como cada levantamento foi produzido, com o objetivo de torná-lo de conhecimento público. Os institutos e as empresas devem divulgar informações, por exemplo, sobre o processo de amostragem e a metodologia de entrevista. Essa publicidade, entretanto, fica apenas na superfície, o que dificulta avaliação da qualidade dos métodos utilizados e pode travar a adoção de novos modelos.
Essa foi uma das conclusões do webinar “Erros em pesquisas eleitorais e a eleição de 2022: no que prestar atenção”, promovido pela Casa JOTA.
O artigo 33 da Lei nº 9.504/1997 determina às organizações que realizarem pesquisas sobre eleições ou candidatos a divulgação de um mínimo de informações. Os institutos esclarecem dados sobre o tamanho da amostra, a pesquisa e a estratificação, mas “se restringem ao mínimo do mínimo”, criticou Raphael Nishimura, diretor de amostragem do Survey Research Center, da Universidade de Michigan, durante o debate.
O especialista exemplificou que há diversas maneiras de selecionar uma amostra. Na hipótese de uma entrevista por telefone, há a possibilidade manter um cadastro de número ou uma metodologia que os gere aleatoriamente. “Cada uma dessas escolhas metodológicas vai ter impacto na qualidade das estimativas. A maioria dos institutos, do que eu vejo pelo menos quando eles reportam a metodologia, não explicam como que essa amostra é selecionada por telefone. Presencialmente, eles explicam um pouco mais, mas ainda assim acho que há um pouco de espaço para melhorias na descrição metodológica.”
Segundo Nishimura, a transparência é dos pontos mais importantes para comparar a qualidade dos métodos utilizados no país em relação aos empregados nos Estados Unidos — um dos países que mais produz pesquisas eleitorais do mundo.
Uma das diferenças citadas entre a realização de levantamentos nos dois países foi a adoção de modelos para cálculos de estimativas. Os Estados Unidos possuem um modelo eleitoral no qual o voto não é obrigatório. Por isso, os pesquisadores desenvolveram modelos que tentam predizer quem são os respondentes que, de fato, irão votar nas eleições. Nas palavras de Neale El-Dash, estatístico e diretor metodológico no PollingData, não existe uma estratégia óbvia de fazer isso, porque dependerá do que a pessoa vai responder, mas é possível inferir indiretamente. Perguntas sobre o interesse na eleição, se ela votou em pleitos passados ou sobre a preferência em algum partido, podem ser caminhos para antecipar essa informação.
No segundo turno das eleições municipais de 2020, o Brasil registrou um recorde de abstenções. Quase 30% dos eleitores aptos a votar não compareceram às urnas, mesmo com o voto obrigatório. No ano de 2018, durante as últimas eleições para presidente, o percentual chegou a cerca de 20%. Essas margens dariam ao país a oportunidade de aplicar modelos de previsão de quais respondentes das pesquisas sairiam de casa no dia da eleição. Contudo, El-Dash vê um problema. “Acho que hoje em dia seria difícil publicar isso sem ter um ruído enorme, porque vão falar: ‘Além de você pegar a pesquisa, você vai lá e tira fora os caras. Não quer [colocá-los] para dar o resultado que você tá interessado’. Acho que a gente não tem maturidade metodológica nesse momento para fazer isso.”
Na análise de Daniel Marcelino, cientista de dados no JOTA, é comum a atribuição de um valor maior a pesquisas realizadas presencialmente, em detrimento das feitas online ou via telefone. Isso nem sempre está correto e é preciso destrinchar no caso a caso. De acordo com o especialista, cada escolha metodológica apresenta uma série de problemas e benefícios. “Em tese, uma pesquisa online pode ser o modo de coleta que mais vai possibilitar uma amostra representativa, por conta de que ela está quase que onipresente. Todo mundo, você vai acessar a pessoa. Não necessariamente agora neste momento, mas talvez em cinco, 10 anos, seja o método, o modo, que tenha maiores possibilidades ao segmento de pesquisa, que, no Brasil, é o menos utilizado, especialmente em campanhas eleitorais.”
Nishimura, do Survey Research Center, ponderou que pesquisas eleitorais estão sujeitas a erro. Eles podem ser de amostra, de não resposta, de coleta ou de seleção. Apesar disso, são erros possíveis de ser previstos e controlados. “Nosso objetivo, da gente que trabalha com pesquisa, não é ter uma pesquisa cem por cento perfeita. Se você pensar dessa forma, as pessoas realmente vão ser inúteis.”
Segundo ele, erros são inerentes ao processo e sempre ocorrerão em pesquisas. O objetivo das entidades é tentar minimizá-los, conforme as restrições de custos e de tempo. Nesse quesito, “institutos têm feito o melhor que eles podem”.
Confira o webinar “Erros em pesquisas eleitorais e a eleição de 2022: no que prestar atenção”.