WEBINAR DO JOTA

Barroso: Moro e Lava Jato pagaram um preço quando ex-juiz foi para o governo

Ministro também disse que Judiciário deve se auto-conter na pandemia para não desequilibrar sistema de saúde

Lava Jato Barroso
Sérgio Moro, o ministro do STF Luís Roberto Barroso e o procurador Deltan Dallagnol / Crédito: José Cruz/Agência Brasil

Para o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), a Operação Lava Jato pagou um preço com a ida de Sergio Moro para o Ministério da Justiça e Segurança Pública. “Depois que ele [Moro] aceitou ir para o governo, uma decisão pessoal, ele pagou um preço e a operação [Lava Jato] também pagou o preço de uma adesão a um governo, a uma determinada política”, afirmou em webinar do JOTA. No entanto, destacou na sequência que a “Lava Jato deixou de ser uma específica operação policial e judicial, passou a ocupar no imaginário brasileiro uma reação a uma velha ordem de apropriação do Estado e de desvio da verba pública”.

Segundo o ministro, a Lava Jato transcende qualquer personagem que tenha tido algum protagonismo. “Ainda que você, eventualmente, não tenha punido todo mundo que devesse ter sido punido, ou ter ido tão a fundo como devesse ter ido, a vitória já foi obtida, o país já mudou”, avalia. “A sociedade mudou, deixou de aceitar o inaceitável”, diz. “A iniciativa privada também mudou, há um business novo no Brasil. Todas as grandes empresas têm um departamento de compliance”.

Para Barroso anteriormente havia no país um pacto oligárquico que “era um pacto de legitimação de apropriação privada do Estado, e de desvio rotineiro do dinheiro público”. Resumiu o contexto brasileiro dizendo: “a gente tem andado na direção certa, mesmo que não na velocidade necessária”.

Barroso não acredita existir um risco institucional no país pelo fato de haver “insuficiências democráticas aqui e ali”. Para o magistrado, o Legislativo e o Judiciário funcionam bem, e as Forças Armadas superaram as tentações do passado.

O ministro fez um alerta com relação ao posicionamento do Judiciário neste momento de crise: “acho que o Judiciário deve ser autocontido nessa pandemia”. Ressaltou que a judicialização da saúde já é um problema, e “no meio da pandemia vai ser um problema maior ainda”.

“Se eu pudesse dar uma recomendação geral [para magistrados], seria o mínimo de voluntarismo, porque o equilíbrio do sistema [de saúde] já é muito delicado para nós termos decisões judiciais interferindo com ele”, afirmou.

Com relação à postura do Supremo Tribunal Federal na pandemia, avaliou que a Corte tem tido uma posição firme em favor da ciência. “O Supremo se uniu e tem contribuído para proporcionar segurança jurídica nesse momento”, destacou.

O ministro foi questionado se um sinal dessa união seria o compartilhamento pelo colega Gilmar Mendes de uma postagem no Twitter em que Barroso repudiou atos no dia 19 de abril pedindo o fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal. “O ministro Gilmar e eu podemos ter muitas divergências de visão de mundo, porém, acho que temos denominadores comuns”, disse. “E a defesa da democracia, claramente, é um denominador comum. Tanto eu como ele fomos contemporâneos de uma ditadura e não desejamos a volta de uma ditadura”, completou.

Eleições municipais

Luís Roberto Barroso assume a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no mês que vem e afirmou que não sabe se as eleições municipais serão em outubro. “Não sei responder hoje, mas eu desejaria que sim”, disse. O ministro revelou que o deadline para tomar uma decisão será o mês de junho.

“Se houver essa necessidade (de adiamento), tenho a expectativa de que possamos adiar em algumas semanas, as realizando em novembro, ou ainda no primeiro domingo de dezembro”, explicou. “Dessa forma, é possível dar posse em primeiro de janeiro”.

O ministro disse ser radicalmente contra a ideia de fazer coincidir as eleições municipais com a presidencial, em 2022. Para ele, a junção traria o risco de nacionalizar a eleição municipal, ou de municipalizar a eleição nacional.

O futuro presidente do TSE cogita, como medida de segurança sanitária, dividir cada turno da eleição em dois finais de semana — e não em apenas um dia. “É possível, mas isso tem que ser negociado com o Congresso. São ideias, acho que vamos precisar de um brainstorm para pensar em como fazer”.

Uma ideia que não está no radar é a volta de voto impresso. “Com a urna eletrônica, é possível afirmar que acabamos com as fraudes. Até hoje, nunca se confirmou a existência de fraude”, afirma. “O apelo pelo voto impresso é mais ou menos como cancelar a assinatura da Netflix ou da Globoplay e comprar um videocassete. É voltar para o pior”, completa.

Barroso demonstrou preocupação quanto às fake news e disse que a internet, imaginada anteriormente como grande esfera pública de debates, hoje vem desservindo a democracia. “Quem imaginar que se possa combater fake news por decisão judicial está cultivando uma desilusão”, ressaltou. Na sequência, o ministro destacou três motivos que o levam a esse entendimento: a caracterização do que é fake news é muito difícil; o Judiciário tem seu próprio tempo e, depois de praticar o contraditório, ouvindo outra parte, passa ao menos uma semana e a notícia já circulou; e, frequentemente, as fake news são disseminadas fora do país.

Webinars

A conversa com Luís Roberto Barroso fez parte da série de webinars diários que o JOTA está realizando, durante a pandemia da Covid-19, para discutir os efeitos na política, na economia e nas instituições. Todos os dias, tomadores de decisão e especialistas são convidados a refletir sobre algum aspecto da crise.

Nesta terça-feira (28/4) o webinar do JOTA será com o procurador-geral da Fazenda Nacional, José Levi, que conversa com Fabio Zambeli e Bárbara Mengardo a partir das 16 horas.

Entre os convidados, já participaram do webinar estão o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, o presidente do STF, Dias Toffoli, o ministro Gilmar Mendes, o prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), a presidente da CCJ do Senado, Simone Tebet (MDB-MS), o presidente da Comissão de Agricultura da Câmara, Fausto Pinato (PP-SP), o economista e presidente do Insper, Marcos Lisboa; além de representantes de instituições como a Frente Nacional de Prefeitos, a Confederação Nacional das Indústrias e a Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho.

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