Exame da Ordem em Números

Brasil tem mais de 1.500 cursos de Direito, mas só 232 têm desempenho satisfatório

Número de cursos recomendados pela OAB é ainda menor: de 1.212 avaliados, só 161 obtiveram selo da Ordem

O Brasil é o país com maior número de faculdade de Direito no mundo e contava, em 2018, com 1.502 cursos para formar bacharéis na área. O aumento foi vertiginoso ao longo dos últimos 20 anos – em 1995, eram apenas 235 cursos os de Direito, o que significa que ao longo de 23 anos o crescimento foi de 539%. Mas quantidade, pelo visto, está longe de significar qualidade, como demonstra a 4ª edição do estudo Exame de Ordem em Números, realizado pela FGV em parceria com a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

O não preenchimento de requisitos básicos pelas instituições de ensino fez com que, em 2013, o Ministério da Educação suspendesse a criação de novos cursos de Direito pelo país. De lá para cá, avaliações e a criação de critérios mais rígidos tem diminuído a velocidade de crescimento de novas faculdades, mas o estudo joga luz para a problemática de que, mesmo assim, a maioria dos cursos já existentes continua abaixo do que o MEC considera satisfatório em termos de qualidade.  

As instituições de ensino superior do país e todos os seus cursos passam por avaliações regulares desde 2004. O Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade) e o Conceito Preliminar de Curso (CPC) são algumas formas de avaliação. O CPC permite avaliar, de forma multidimensional, a capacidade dos cursos de graduação de oferecerem condições adequadas a uma boa formação, como a titulação dos professores, os percentuais de docentes que cumprem regime parcial ou integral, recursos didático-pedagógicos, mas também aspectos como infraestrutura e instalações físicas. 

“No que concerne ao curso de Direito, especificamente, certos padrões mínimos na qualidade da graduação são necessários para que aos bacharéis seja oferecida a formação acadêmica adequada para o bom desempenho no Exame de Ordem, etapa cujo cumprimento é obrigatório para a posterior atuação como advogado. Assim, o Exame representa o principal instrumento de avaliação da qualidade de um determinado curso, mesmo sem existir um sistema de monitoramento pelos órgãos de educação responsáveis. Em última instância, isso ajuda a garantir uma formação de qualidade para um futuro exercício da profissão”, argumentam os autores do estudo. 

O estudo mostra que, em 2015, apenas 232 dos 963 cursos avaliados no CPC tiveram desempenho considerado satisfatório, um percentual de 24,1%. Para ser considerado satisfatório, é necessário ter um CPC igual ou superior a 2,95 — a pontuação máxima, nesta escala, é de 5 pontos.

Outra forma de avaliação, realizada pela OAB, é o Selo OAB Recomenda. Desde 2001, a certificação reconhece e premia as instituições de ensino superior que atendam aos critérios de excelência, regularidade e qualidade mínima compatíveis com o que a OAB e a sociedade brasileira esperam. Em 2001, de 176 cursos avaliados, 52 receberam o selo. Já em 2018, de 1.212 cursos que foram verificados pela Ordem, apenas 161 foram recomendados. 

Para Felipe Santa Cruz, presidente da OAB, boa parte das instituições de ensino poderia melhorar a grade curricular, medida que, segundo ele, tem sido discutida pelas comissões do órgão.

“Ao nosso ver, a grade curricular não é voltada para advocacia no mínimo suficiente, nós estamos discutindo com algumas entidades alguma forma de fazer um acompanhamento do próprio desempenho das faculdades mês a mês”, aponta Santa Cruz. “Quando eu comecei a dar aula, nos anos 1990, meus alunos queriam, na sua grande maioria, ser servidores públicos. Hoje, com a crise fiscal brasileira, isso é praticamente inexistente. Então, as pessoas vão compulsoriamente para a advocacia privada, muitas sem vocação, e infelizmente com, digamos assim, uma condescendência, uma falta de atuação concreta e de planejamento do Ministério da Educação”.

A enorme oferta de cursos sem a devida demonstração da qualidade fez o MEC suspender, em 2013, o credenciamento de novos cursos de Direito, até que fossem estabelecidos critérios para expansão e regulação desse campo. Em 2014, foi publicada norma nesse sentido, a Portaria Normativa 20/2014. A partir dessas novas diretrizes, o MEC passou a exigir indicadores mais altos e consistentes das instituições e de seus cursos, de forma que o Índice Geral de Cursos (IGC) ou Conceito Institucional (CI) seja igual ou superior a 3, em uma escala de 1 a 5. Além disso, passou a ser necessária, como condição para o credenciamento, a obtenção de CPC igual ou superior a 4, com pontuação mínima de 3 em cada quesito avaliado. 

A portaria também elevou a importância dos pareceres do Conselho Federal da OAB no processo de credenciamento. Desde a década de 1990, a OAB colabora no processo administrativo de autorização e reconhecimento dos cursos de graduação em Direito. A partir de 2015, esse caráter foi incorporado ao padrão decisório do MEC, mediante o uso do parecer da OAB como fundamento para a avaliação dos cursos. 

Contudo, o parecer da OAB não tem efeito vinculante sobre a decisão do MEC, assim, um curso pode ser credenciado mesmo que receba parecer desfavorável da OAB. Para isso, o curso deve apresentar uma excelente pontuação (IGC ou CI igual a 4 ou maior, ou conceito também igual a 4 ou maior, em cada uma das dimensões do Conceito de Curso – CC). Por outro lado, faculdades que tiverem sido aprovadas pela OAB, mas que só alcançaram nota 3 no Conceito de Curso, podem ter sua instalação deferida pelo MEC.