Quociente eleitoral

Como funciona a eleição de deputados e senadores?

Entenda a aplicação do quociente eleitoral, a cláusula de barreira e as diferenças nas eleições para Câmara e o Senado

eleição deputados; reforma tributária
Plenário da Câmara dos Deputados / Foto: Roque de Sá/Agência Senado

O processo de votar em um deputado federal e em um senador é bastante parecido em frente à urna eletrônica. Basta escolher o candidato de preferência, digitar o número dele e confirmar o voto. No entanto, há diferenças nas regras para a eleição de deputados e senadores.

A primeira diferença é que nem todos os parlamentares no Congresso Nacional têm de correr atrás de um novo mandato de quatro em quatro anos. Ainda que as 513 vagas para a Câmara dos Deputados sejam sempre colocadas em disputa a cada quatro anos nas eleições gerais, apenas parte do Senado é renovada, já que o mandato de um senador dura 8 anos.

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No pleito de outubro deste ano, por exemplo, somente um terço das 81 vagas do Senado estará em jogo. Ao todo, 27 senadores serão eleitos – um por Unidade Federativa. Essas vagas são referentes aos mandatos dos políticos na Casa que se encerram no início do ano que vem.

Os senadores que têm mandato até o começo de 2027 podem continuar no cargo normalmente e só devem buscar a reeleição em 2026, quando o pleito renovará os outros dois terços da Casa. Daqui a quatro anos, portanto, serão disputadas 54 vagas ao Senado – dois senadores por Unidade Federativa. Não há limite de vezes para a reeleição dos parlamentares.

Os senadores representam os estados e, por isso, o número deles para cada Unidade Federativa é o mesmo: três. A ideia é que todos os estados tenham direitos iguais de representatividade na Federação, independentemente do tamanho, da população ou da força econômica.

Já os deputados federais representam o povo. A bancada de cada unidade da federação na Câmara é proporcional à população dela. Mesmo assim, nenhuma pode ter menos de oito e mais de 70 deputados.

Entenda os cálculos para a eleição de deputados e senadores

Os senadores se elegem por meio do sistema majoritário – o mesmo aplicado ao presidente da República, a governadores e a prefeitos, embora estes façam parte do Poder Executivo. 

A lógica é bem simples e direta: ganha quem tiver o maior número de votos válidos no estado em que concorre. Votos brancos e nulos são desconsiderados. Não há segundo turno no caso de senadores, pois não precisam atingir mais do que 50% dos votos válidos. Ter mais votos do que os concorrentes é o suficiente.

Em 2018, no Distrito Federal, por exemplo, Leila Barros (hoje no PDT, mas à época no PSB) e Izalci Lucas (PSDB) se elegeram ao Senado com 17,76% e 15,33% dos votos válidos, respectivamente, já que havia duas vagas em disputa.

Já a eleição dos deputados federais se dá por meio do sistema proporcional – que também é aplicado nas eleições para deputados estaduais, distritais e vereadores.

Nesse modelo, o candidato a deputado depende não só de si, mas também do desempenho do partido. Os partidos elegem uma quantidade de deputados de forma proporcional aos votos que todos os seus candidatos ao cargo receberam e aos votos diretamente na legenda.

O chamado quociente eleitoral é que vai ditar quais partidos terão direito a ocupar as cadeiras da Câmara dos Deputados. Ele varia em cada Unidade Federativa e é obtido por meio da divisão do número de votos válidos pelo número de vagas em disputa.

Por exemplo, suponha que  em determinado estado houve um total de 400 mil votos válidos, sendo que o partido A conseguiu 200 mil, o partido B alcançou 50 mil e o partido C atingiu 15 mil destes votos na corrida por 16 vagas para deputado federal. O quociente eleitoral neste caso será de 25 mil (400 mil/16). Dessa forma, os partidos A e B poderiam ter vagas na Câmara, mas o partido C, não, mesmo que conte com um candidato que tenha recebido muitos votos.

O número inicial de vagas a que cada partido que alcançou o quociente eleitoral terá direito é determinado pelo quociente partidário. Este valor é calculado por meio do número de votos de cada legenda dividido pelo quociente eleitoral. Portanto, o partido A preencheria oito vagas (200 mil/25 mil) e o partido B preencheria duas vagas (50 mil/25 mil).

As vagas são preenchidas pelos candidatos que obtiveram mais votos dentro do partido. Além disso, para ser eleito, o candidato precisa alcançar um mínimo de votos: 10% do quociente eleitoral. No caso do exemplo, precisaria de ao menos 2,5 mil votos (10% de 25 mil).

Em caso de sobra de vagas a serem ocupadas, a distribuição é feita dividindo o número de votos válidos do partido pelo número de cadeiras obtidas mais um. Quem tiver a maior média terá direito à vaga remanescente.

A partir deste ano, para participar do cálculo da distribuição de sobras, os partidos ou federações têm ainda de alcançar 80% do quociente eleitoral e contar com candidatos com votação de, no mínimo, 20% do quociente eleitoral. Portanto, a regra ficou mais rígida.

Atualmente, 23 partidos contam com representantes na Câmara dos Deputados enquanto 16 têm cadeiras no Senado.

A advogada eleitoral Claudia Bressan, membro da Abradep (Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político), avalia que essa alteração deve dificultar a eleição de deputados de partidos menores. 

“Aí entra a importância dos puxadores de voto. Os partidos acabam tendo alguns candidatos fortes dando condição para aquele que não foi bem votado também poder ocupar uma vaga e participar do cálculo de sobra das vagas remanescentes”, afirmou.

Quociente eleitoral na eleição de deputados e puxadores de votos

Os puxadores de votos são candidatos fortes, normalmente já conhecidos, com perspectiva de número significativo de votos, como celebridades, políticos experientes e personalidades polêmicas.

Eles são escolhidos pelos partidos ou pelas federações partidárias por terem tantos votos que conseguem garantir a eleição de deputados menos votados por causa da grande bancada à qual a agremiação terá direito com base no total de votos obtidos, catapultados pelo puxador. É comum, inclusive, os puxadores terem a campanha priorizada pelos respectivos partidos. 

Muitas vezes, sem os puxadores, a quantidade de deputados eleitos de um único partido ou coligação não seria a mesma.

Um dos puxadores de votos mais emblemáticos foi o humorista Tiririca (PL, mas à época no PR), que garantiu a sua eleição a deputado por São Paulo, em 2010, com 1.353.820 votos. O quociente eleitoral no estado naquela eleição foi de 304.533. Assim, beneficiou candidatos da sua coligação que atingiram cerca de 90 mil votos cada um, por exemplo. Candidatos de outra coligação com mais votos ficaram de fora da Câmara.

Naquele mesmo ano, a votação dos colegas de coligação Manuela D`Ávila (PCdoB) e Beto Albuquerque (PSB), com 482.590 e 200.476 votos, respectivamente, ajudaram três candidatos a se elegerem. Um deles teve cerca de 28 mil votos. Enquanto isso, Luciana Genro (PSOL) ficou de fora, apesar dos 129.501 votos, porque o partido não alcançou o quociente eleitoral exigido, de 193.114.

Em 2002, Enéas Carneiro (Prona) foi o deputado federal mais votado do país, com cerca de 1,5 milhão de votos, e puxou junto mais cinco candidatos do então partido. Um deles tinha somado somente 275 votos. Na época, não existia a exigência de o candidato alcançar 10% do quociente eleitoral para assumir uma cadeira.

Outros políticos que já foram puxadores de votos incluem Anthony Garotinho, Chico Alencar, ACM Neto, Celso Russomanno e, em 2018, Eduardo Bolsonaro que teve 1,84 milhão de votos, atual recorde de votação para o cargo.

Nas eleições de 2022 à Câmara, alguns potenciais puxadores de voto são o cantor Belo (PL), novamente o deputado Eduardo Bolsonaro (PL) e o ex-procurador da República Deltan Dallagnol (Podemos), além dos ex-candidatos à Presidência da República Marina Silva (Rede) e Guilherme Boulos (PSOL).

Claudia Bressan explica que, de maneira geral, como os candidatos a deputado e partidos ou federações são dependentes uns dos outros para terem direito a cadeiras na Câmara – e os pré-requisitos se tornaram mais rígidos para este ano –, é mais importante do que nunca ter candidatos fortes.

Pelo fato de os puxadores poderem beneficiar candidatos não tão votados de um mesmo partido ou federação, ela considera que o modelo proporcional dá oportunidade a políticos menos conhecidos.

Cláusula de barreira

Outro ponto importante considerado pelas legendas é a cláusula de barreira. A depender do desempenho mínimo de cada partido ou federação nas eleições, a regra condiciona o acesso aos recursos do Fundo Partidário e à propaganda gratuita no rádio e na televisão.

No pleito deste ano à Câmara dos Deputados, para garantir esses acessos, as siglas devem alcançar pelo menos 2% dos votos válidos, distribuídos em pelo menos nove unidades da Federação, com um mínimo de 1% dos votos válidos em cada uma delas; ou eleger pelo menos 11 deputados distribuídos em pelo menos nove unidades da Federação.

Os limites da nota de corte são superiores aos aplicados nas eleições de 2018 e vão crescer de forma gradativa até 2030.

Formação de federações

A partir das eleições de 2022, partidos com afinidade ideológica poderão se unir em federações, de abrangência nacional. Para os cálculos da distribuição de vagas na Câmara a partir dos votos obtidos, a federação será tratada como um único partido. 

Por isso, as federações são vistas como uma espécie de tábua de salvação para partidos menores que, sozinhos, perigam não alcançar os índices exigidos pela cláusula de barreira ou para a obtenção de cadeiras na Câmara.

O Cidadania anunciou que se juntará ao PSDB para formar uma federação. O PSOL e a Rede também devem embarcar no modelo.

As federações passaram a ser previstas na reforma eleitoral do ano passado e consistem na união de dois ou mais partidos que devem permanecer aliados ao longo do mandato conquistado. Na prática, os parlamentares integrantes de uma federação deverão atuar como uma bancada única. A formação de federações vale tanto para o sistema proporcional quanto para o majoritário e se aplica em todos os estados.

As coligações – em geral, uniões efêmeras de cunho mais estadual visando apenas as eleições – estão proibidas para o sistema proporcional. A iniciativa continua valendo para o sistema majoritário.

Voto de legenda

O chamado voto de legenda é possível apenas nas eleições do sistema proporcional. Neste caso, o eleitor digita só os dois números relativos ao partido de preferência, sem votar em um candidato específico.

Por meio da medida, o eleitor pode ajudar sua sigla preferida a alcançar o quociente partidário. Isso porque, a depender dos votos, aumentará a quantidade de cadeiras obtidas pela legenda na Câmara, que serão ocupadas por seus candidatos mais votados, resguardadas as regras já mencionadas.

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